Uma das melhores coisas de se ter um blog, é o contato que você tem com as outras pessoas que também gostam e/ou entendem do assunto. Não só conversar e interagir com os leitores (um dos motivos pelos quais adoro o twitter e escrever mailbags), mas também de conhecer pessoas que vieram antes de mim nessa vida de blogs e colunas esportivas, muita delas pessoas que eu admiro e me inspiro nesse "trabalho". O melhor exemplo provavelmente é o do meu blog brasileiro favorito (e que me fez criar o TMW), o Bola Presa, cujos donos eu conheci por causa do blog. Mas recentemente, eu tive a oportunidade que para mim é o ponto mais alto desses quase cinco anos de blog: conversar sobre baseball com um dos meus maiores ídolos do meio, o grande Jonah Keri.
Se você gosta de baseball e não conhece Jonah Keri, está perdendo o seu tempo. Ele é, na minha opinião, o melhor escritor de baseball na atualidade. Keri é o principal colunista de baseball para o portal Grantland, da ESPN; host de um podcast muito bom sobre o assunto; e autor de dois best-sellers: o excelente "The Extra 2%: How Wall Street Strategies Took a Major League Baseball Team from Worst to First", e o recém-lançado "Up, Up and Away" (falaremos mais dele daqui a pouco). E claro, um dos meus escritores favoritos da atualidade.
Eu pedi a Keri se ele não poderia me dar uma rápida entrevista. O objetivo, como eu expliquei a ele, era a chance de oferecer ao público brasileiro alguns insights sobre baseball a partir do ponto de vista de um especialista que trabalha com o assunto. Eu e muitos outros aqui no Brasil fazemos nossa parte para tentar difundir o baseball no país, mas ainda vejo muito preconceito e desconfiança, pessoas que não estão muito dispostas a aceitar a palavra de um brasileiro sobre o assunto que não cresceu e viveu o esporte como um americano. Mesmo não sendo americano - Keri é canadense - ele trabalha para uma grande empresa americana, mora em Denver, escreve e vive a realidade da MLB e é ultra-qualificado para falar sobre o assunto. Achei que talvez ter uma pessoa do nível dele falando sobre o assunto pudesse atingir um número maior de pessoas.
Para nossa sorte, ele topou uma conversa sobre o assunto, e falar um pouco sobre a MLB, o baseball no Brasil, estatísticas avançadas, Montreal Expos e seu novo livro, "Up, Up and Away: The Kid, the Hawk, Rock, Vladi, Pedro, le Grand Orange, Youppi!, the Crazy Business of Baseball, and the Ill-fated but Unforgetable Montreal Expos"!
(Livro esse que estarei sorteando entre meus seguidores para comemorar essa entrevista e o lançamento do Especial Top100 Prospectos do Baseball. É só mandar um email para tmwarning@hotmail.com para participar do sorteio! Aproveite!)
Abaixo está a entrevista traduzida. Se quiser ler a entrevista em inglês, como ela foi feita, você também pode: é só clicar aqui. Os comentários entre chaves e sem formatação são meus adendos posteriores.
Two-Minute Warning: Jonah, quando alguém pensa no Canadá e em esportes, o primeiro que nos vem a mente é hockey, e depois lacrosse. Não é exatamente igual ao Brasil, que era basicamente um país de um esporte só (com futebol), e Montreal TINHA um time profissional de baseball na época, é claro. Mas como foi que você acabou trabalhando com baseball? Você também teve a experiência de crescer gostando de um esporte que não era tão popular ao seu redor, ou Montreal era uma cidade envolvida o suficiente com o esporte na época?
Jonah Keri: Montreal na verdade era uma cidade bastante envolvida com baseball quando eu comecei a acompanhar o esporte no começo dos anos 80. Os Expos [Montreal Expos, o time da MLB local que anos depois virou o Washington Nationals] terminaram em segundo ou terceiro em público na liga por vários anos nesse período, e até chegou a superar o Yankees nisso por alguns anos. Não era no nível do hockey, mas eles certamente tinham o apoio popular quando eu era criança.
TMW: Baseball tem experimentado um crescimento recente aqui no Brasil, com mais jogos na TV transmitidos em mais canais, dois jogadores nas ligas maiores e cobertura mais acessível, tanto da mídia profissional como da amadora. O que você acha que poderia nos ajudar a dar o próximo passo? Talvez um jogo de pré-temporada no Brasil? Você acha que existe alguma chance disso acontecer em um futuro próximo?
JK: Eu diria que isso ainda está um pouco distante no futuro, já que a MLB provavelmente tem outros países que gostaria de visitar primeiro. Mas é bom ver o esporte sendo abraçado por um país tão grande e vibrante, com certeza.
TMW: Uma coisa que inegavelmente ajudou a aumentar o interesse por baseball aqui no Brasil foi a chegada de dois jogadores brasileiros na MLB, Yan Gomes e Andre Rienzo. O que você acha deles como jogadores? Você acha que algum deles pode se tornar grande o suficiente para atrair ainda mais atenção para o esporte?
JK: Gomes é um catcher titular nas ligas maiores, algo que somente 30 pessoas no mundo todo podem dizer que são, então isso algo bem grande. Ele é jovem o suficiente para continuar por perto por mais um bom tempo, também. Rienzo não é um jogador tão bom, e seus números até agora não necessariamente sugerem um grande futuro. Mas ele ainda é um arremessador titular pelo White Sox, e isso é algo do que se orgulhar.
TMW: Uma das grandes reclamações das pessoas que estão sendo apresentadas ao baseball é que o jogo é muito longo e para demais (especialmente em contraste com o futebol, um jogo que nunca para). Você ve isso como um problema a expansão para novos mercados?
JK: Não só novos mercados, eu gostaria de ver isso ser melhorado até para pessoas que estão acostumadas ao ritmo do jogo. Mas é difícil imaginar uma melhora significativa, a não ser que os juízes comecem a pressionar os arremessadores para lançar mais rapidamente.
TMW: Se você estivesse apresentando baseball para alguém, quais são as principais coisas que você diria a ele? Em outras palavras, o que você acha que, no baseball, é o mais interessante para alguém que está apenas começando a conhecer o jogo?
JK: Bom, o ritmo lento - desde que não seja lento demais - pode ser ótimo. Como um fã, você tem a oportunidade de acompanhar o pensamento dos rebatedores e arremessadores, ao contrário de um esporte de ritmo acelerado (digamos, basquete ou hockey) onde tudo acontece rápido demais e você não tem tempo para pensar. E claro, baseball tem muitos feitos atléticos incríveis, como futebol ou qualquer outro esporte. É um grande prazer assistir a alguém como Miguel Cabrera, Mike Trout ou Yasiel Puig jogar.
TMW: Qual a sua opinião sobre sabermetrics (estatísticas avançadas)? Você acha que elas podem fazer um trabalho muito bom capturando o efeito do que acontece em um dado jogo ou temporada (dada uma amostra suficientemente grande), ou você fica do lado da abordagem "tradicional"? Por que?
JK: Eu estou profundamente imerso em sabermetrics, tanto pelo meu trabalho como sendo um fã do esporte. Mas essa não precisa ser uma situação de um ou outro. Você pode assistir e apreciar o jogo em um nível básico, mas ao mesmo tempo apreciar métodos mais completos de se acompanhar o esporte. Eu nunca entendi porque algumas pessoas acham que tem que ser de um jeito ou de outro.
TMW: Uma coisa que eu percebi aqui no Brasil é que os fãs em geral estão muito interessados em estatísticas avançadas, é o principal assunto de pedidos que eu recebo por email, e meu post explicando sabermetrics é O post mais lido em quase cinco anos de Two-Minute Warning. No entanto, tem um grande obstáculo: muitas pessoas - inclusive da mídia tradicional - simplesmente as odeiam e fazem de tudo para desmerecê-las. Você não pode usar uma estatística para ilustrar um pouco ou mesmo uma curiosidade que elas começam a reclamar, mesmo sem ter nenhuma evidência para provar o contrário. Você provavelmente lida com esse tipo de coisa com muito mais freqüência, e em uma escala muito maior. O que acha disso?
JK: As pessoas se sentem ameaçadas por conceitos que elas não entendem. Seu trabalho, meu trabalho... o nosso trabalho é escrever de uma forma que convide as pessoas para o debate. Escrever de forma elaborada e inteligente mas respeitosa, escutando as opiniões dos outros, mas sem ter medo de defender nossas posições. Se mesmo assim algumas pessoas ainda não querem escutar, bom, elas que estão perdendo.
TMW: Uma vez eu estava assistindo a um jogo de baseball, e durante um momento parado (troca de pitchers), o comentarista começou a explicar uma estatística avançada. Não era nem algo complicado, era FIP. Mas o narrador imediatamente o cortou, dizendo que "essas coisas não são úteis e fazem as pessoas perder o interesse no esporte". Eu achei ridículo. Eu entendo se alguém disser que não confia totalmente em uma estatística como WAR ou VORP, ou que estatísticas não cobrem todas as partes do jogo, mas ignorar totalmente qualquer tipo de estatística e dizer que só sua opinião visual vale mais do que décadas de desenvolvimento de estatísticas, é outra coisa. Uma pessoas uma vez chegou até a dizer que "nenhum sabermetrista nunca ganhou um título". Na sua opinião, por que isso ocorre?
JK: É o mesmo que na resposta anterior. Quando sua profissão depende do valor que a sua opinião tem, e você não sabe nada sobre estatísticas, então você vai ter um interesse pessoal para desmerecer essas estatísticas. Como eu disse, pessoas inteligentes e de cabeça aberta são perfeitamente capazes de processar e mesmo aproveitar os dois lados.
TMW: Você, é claro, é um grande fã dos Expos. Estranhamente, os Expos são razoavelmente populares por aqui, um time carismático que se foi cedo demais, muitas vezes atraindo comparações com os Seattle Supersonics. Você pode comentar um pouco sobre essa popularidade do time?
JK: Era um time cheio de jogadores de nível Hall da Fama, mas que também eram grandes personalidades. Montreal foi o único time canadense da MLB por alguns anos, e mesmo depois que Toronto entrou na liga, os Expos continuaram sendo um time único, porque Montreal é a única grande cidade na liga que realmente parece européia (Toronto é uma Chicago mais limpa, digamos). O Expos também era o único time que fazia tudo em duas linguagens (inglês e francês), o que os diferenciava. Montreal é uma cidade muito agitada que gosta de festa, então quando o time era bom (final dos anos 70 até começo dos anos 80, e depois de novo nos anos 90), as pessoas se sentiam atraídas ao estádio e adoravam vê-los jogar.
TMW: Finalmente, você pode nos falar um pouco mais sobre o seu novo livro, "Up, Up and Away: The Kid, the Hawk, Rock, Vladi, Pedro, le Grand Orange, Youppi!, the Crazy Business of Baseball, and the Ill-fated but Unforgetable Montreal Expos" (isso que é um título!!), que inclusive eu vou sortear como um presente para comemorar o lançamento do nosso projeto especial de baseball?
JK: Foi muito divertido. Eu falei com cada um dos grandes jogadores da história da franquia - Pedro Martinez, Gary Carter, Tim Raines, Andre Dawson, Dennis Martinez, Rusty Staub, Steve Rogers... 130 entrevistas no total. Então o que você tem são respostas muito divertidas e genuínas de pessoas que estiveram lá, e que você não iria obter de jogadores atuais que precisam tomar cuidado em proteger sua imagem. Também tem muito material sobre a história da cidade, sobre as mudanças nas finanças do baseball, histórias da vida de muitos fãs e de mim mesmo... e dos bastidores. É provavelmente a melhor coisa que eu algum dia vou escrever na minha vida, e fico muito feliz que outras pessoas venham a ler!
(Lembrando que se você quer concorrer a uma cópia de Up, Up and Away, é só mandar um email para tmwarning@hotmail.com!)
Muito boa a entrevista! Quem foi o narrador que cortou a explicação das estatísticas avançadas?
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