Some people think football is a matter of life and death. I assure you, it's much more serious than that.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A evolução (?) do jogo aéreo na NFL

Os números estão deixando cada vez mais difícil 
de lembrar de como esses caras eram bons...


Uma das histórias mais populares do começo da temporada era que essa temporada ia ser o "Ano do Quarterback". Mesmo agora, algumas pessoas ainda insistem que esse é o tal Ano do Quarterback. Eu ainda me pergunto como é possível alguém argumentar isso com seriedade quando tinhamos Mark Sanchez, Luke McClown, Tarvaris Jackson e Matt Moore como titulares na Liga. Tudo bem, eu entendo que depois da entresafra de talento na posição que tivemos no final dos anos 90 e começo dos anos 2000 realmente é muito bom ver tantos QBs talentosos na Liga ao mesmo tempo, mas não precisamos exagerar. Sempre que eu pergunto porque as pessoas acham isso, elas respondem duas coisas, sendo elas 

a) Quando foi a última vez que tivemos tantos Quarterbacks de alto nível na Liga ao mesmo tempo??

b) Nós temos cinco ou seis QBs que podem quebrar o recorde de jardas aéreas pra uma única temporada, temos batidos recordes de jardas aéreas e de recepções, TDs pelo ar, grandes times são determinados por grandes Quarterbacks, nunca a Liga registrou tantas viradas em quartos períodos, temos QB Ratings e aproveitamentos superiores a quase todas as outras temporadas da NFL, é claro que cada vez mais temos grandes Quarterbacks surgindo e preenchendo o espaço na Liga.

Passando pelo ponto a (Razoável depois da queda de talento do fim de 90-começo de 2000), chegamos ao ponto b. E o ponto b é exatamente o problema. Numa época onde temos tantas formas diferentes para medir os jogadores por números, métricas avançadas e estamos viciados em Fantasy Football, as estatísticas começam a ter um valor muito maior. Você pode não assistir a uma partida de alguém, mas se olhar suas estatísticas vai falar "Hmm, esse cara é bom" ou "Hmm, esse cara fede". Não tem nada de errado em se fazer isso, estatísticas estão aí justamente para isso, mas o que a gente tem que ter é critério pra saber usar essas estatísticas da maneira certa. O problema é que as estatísticas as vezes sofrem distorções por algum fator, um dos motivos pelos quais é tão difícil comparar jogadores de diferentes épocas. O jogo no qual Jim Brown reescreveu os recordes de corridas é diferente do jogo onde Emitt Smith fez o mesmo. Não devemos olhar simplesmente para os números, e sim para tudo que estava em volta deles. Por isso chegou a hora de fazer isso para Quarterbacks e resolver de uma vez por todas a questão.

A primeira e mais importante coisa que temos que lembrar é o seguinte: Um esporte não é algo parado no tempo. Ele evolui, se modifica, adiciona coisas novas e tira coisas antigas. O futebol americano não é excessão, ele está sempre se adaptando a novos tempos e novas situações. E cada vez mais, a NFL está se modificando na direção de uma Liga de ataques aéreos e de Quarterbacks. Está cada vez mais fácil para se jogar na posição e conseguir grandes números, e por isso as estatísticas dos QBs de hoje ficam tão mais inchadas. As 5000 jardas do Dan Marino foram um feito absurdo em 1984, mas em 2011, 2012 esse número pode ser facilmente atingido por uns quatro Quarterbacks diferentes. O que a gente tem que entender é que conseguir jardas e TDs pelo ar é muito mais fácil e portanto tem um peso muito menor hoje em dia. Mas mesmo assim, as pessoas olham os números como coisas absolutas independentemente da situação onde foram conseguidas.

Claro que essa mudança não aconteceu de uma hora pra outra. Elas foram graduais, com uma série de pequenas mudanças que foram acumulando. Em comparação com a década de 80/começo dos anos 90 (A Era de Ouro dos Quarterbacks da NFL), hoje em dia os Quarterbacks tem uma série de vantagens. Por exemplo:

a) Hoje em dia os defensores só podem encostar nos recebedores na linha de scrimmage, qualquer tipo de contato na secundária é falta. Isso limita enormemente o que os defensores podem fazer para evitar que os recebedores consigam as recepções, tudo que os DBs de antes podiam fazer para terem alguma vantagem agora é falta, o que naturalmente ajuda em muito o ataque aéreo. A única coisa que falta proibir são as interceptações - não duvidem, ainda podemos chegar lá, estamos no caminho.
b) Os QBs estão muito menos vulneráveis a pressões e ataques da defesa, eles não podem ser atingidos acima do pescoço ou abaixo da cintura, o que torna muito mais difícil para um defensor conseguir um sack, o que favorece todos os QBs mas especialmente os QBs que tem como característica sair do pocket.
c) A gota d'água, no final, foram as mudanças relativas a novas regras protegendo concussões. Agora você pode mandar seus WRs e TEs pelo meio trocentas vezes sabendo que eles não podem receber pancadas mais fortes com o capacete. Antes você tinha que tomar cuidado, mas agora os WRs podem receber 20 passes sem sofrerem nenhum tipo de punição física por isso. Por isso o Wes Welker está tendo uma temporada tão boa, por melhor que ele seja. Ele é um WR ágil que gosta de jogar em rotas curtas pelo meio, as rotas que mais levam trombadas. Antes ele estaria em coma depois de um jogo de 16 recepções (e 16 pancadas na cabeça), agora você pode fazer isso normalmente e ainda ver ele jogar a temporada toda. É como se fosse um jogador de videogame, mas isso só foi possível na vida real nessa temporada.

Existe mais vários outros exemplos, mas esses são os mais importantes. Nisso tudo vocês podem ver como ao longo do tempo o jogo foi cada vez mais se tornando atraente ao passe. Agora você não se machuca tanto porque leva pancadas mais fracas, pode se livrar mais rápido da bola sem se preocupar com defensores físicos,  sabe que seus recebedores tem muito mais condições de se livrarem da marcação, pode jogar com o mesmo Wide Receiver trocentas vezes sem se preocupar com ele se lesionando, e cada vez mais os ataques deixam de jogar pelo chão para se dedicarem ao jogo aéreo. Quem pode culpá-los, se é tão mais fácil passar do que correr?

Essas mudanças tiveram principalmente duas motivações, uma legítima e digna (proteger a saúde dos jogadores) e outra mais obscura (aumentar os pontos das partidas e torná-las mais ofensivas depois que defesas dominaram a NFL no começo da década), mas é inegável que elas tiveram o impacto de redirecionar o jogo para o ar. QBs agora se machucam menos, duram mais e jogam em ataques que rendem mais. Dos cinco maiores QBs dos anos 80/90 (Pra mim os cinco maiors de todos os tempos), Steve Young e Troy Aikman encerraram suas carreiras por conta de concussões (hoje em dia não podemos acertar a cabeça dos QBs, então a chance disso acontecer cai mais e mais, pra sorte do Aaron Rodgers), um por causa de lesões no joelho (Dan Marino, hoje em dia QBs não podem receber tackles abaixo da cintura), e Joe Montana teve sua carreira encerrada quando foi atingido por uma violenta capacetada no seu ombro, que hoje é proibida (Nota: Isso aconteceu em 1990. O 49ers de Montana tinha vencido a NFL em 88, 89 e estava ganhando por 10 pontos do Giants na final de conferência quando ele se lesionou e viu sua carreira acabar e o Giants virar a partida. Não fosse essa jogada, o Niners provavelmente seria campeão aquele ano e talvez nos seguintes, terminando a carreira com pelo menos cinco títulos. Sinto muito, você NUNCA vai conseguir argumentar decentemente que Joe Montana não é o maior QB de todos os tempos). O único que escapou foi John Elway.

Quando olhamos QBs pelo Rating  até o começo da temporada, tirando o primeiro lugar (Steve Young), temos Tony Romo, Phillip Rivers e Matt Schaub no top 10, na frente de dezenas de QBs muito melhores. Isso aconteceu porque eles jogam numa era onde números (afinal, os ratings são baseados neles e somente neles) para QBs são muito mais fáceis, se você for comparar o Rating em relação à época verá que a tendência tem sido o crescimento dos Ratings desde a década de 70. Uma parte disso pode ser explicada pelo boom de talento nos anos 80 e 90, mas no final dos anos 2000 esse crescimento está acontecendo de forma artificial. Não é uma coincidência que todos os Super Bowls pós-2004 foram vencidos por Tom Brady, Peyton e Eli Manning, Drew Brees, Big Ben Roethlisberger e Aaron Rodgers depois que Brad Johnson e Trent Dilfer foram os vencedores em 2000 e 2002. É verdade.

Isso nem de longe quer dizer que devemos deixar de lado nossa geração de grandes QBs (porque esse ponto é verdadeiro), ou que devemos idolatrar os QBs que já passaram e nos afogarmos num mar de nostalgia. Sempre é bom sentir saudade e valorizar o que passou, mas nós não podemos deixar isso impedir que vejamos o que temos de bom agora, e infelizmente é algo que acontece bastante quando temos saudosismo. Meu argumento não é esse. OS anos 80/90 foram incríveis do ponto de vista dos QBs, devemos sempre lembrar disso, mas isso não quer dizer que não tenhamos grandes coisas no momento. Temos grandes QBs da velha geração aproveitando sua longevidade (Brady, Manning, Drew Brees), temos QBs jovens que conquistaram seu espaço na Liga (Big Ben, Rivers, Rodgers) e temos QBs que estão chegando para disputar seu lugar (Cam Newton, Andy Dalton, Andrew Luck... não resisti). Temos mais é que valorizar o que temos nas mãos hoje, mas sem ficarmos comparando com os outros por causa de meras estatísticas. Podemos usar estatísticas para comparar QBs da mesma época, numa mesma temporada, mas usar essas mesmas estatísticas para comparar diferentes épocas é um absurdo. Se o Rodgers passar das 5000 jardas e quebrar o recorde do Marino, isso não quer dizer absolutamente NADA sobre Rodgers em relação a Marino, só quer dizer que ele foi o QB mais prolífico em jardas de 2011. Só.

Ao invés de ficarmos babando nas estatísticas dos QBs dessa temporada e falando como temos mais qualidade na posição do que nunca - o que é uma besteira sem tamanho - o que nós temos que fazer é aprender a olhar o que temos e o que tivemos, e especialmente saber avaliar tudo isso independente de estatísticas. Se Marino tivesse jogado na NFL hoje, talvez tivesse passado das 6 mil jardas, talvez não. São jogadores diferentes, jogando jogos diferentes que produzem números diferentes, e nosso desafio é olhar além desses números, e apreciarmos realmente o quão grandes esses jogadores foram sem ficar pensando que não produziram tantas jardas e ratings como os QBs de hoje. Apreciem pelo que eles foram de verdade, não pelo que fizeram em comparação com números que vemos agora. E nunca deixem a apreciação pelos QBs do passado evitar que vejamos o que temos de bom no momento. Mas vejam além dos números, com consciência crítica de que cada jogador está num contexto diferente, que a gente precisa avaliar o todo pros detalhes fazerem sentido. E por favor, parem de se basear em estatísticas para falar que 2011 é o Ano do Quarterback, que tal jogador é melhor que o outro porque teve mais jardas e tudo mais.

4 comentários:

  1. concordo. Nao da' pra fazer comparacoes definitivas entre epocas diferentes. E' a mesma questao de quem e' o melhor tenista de todos os tempos. Como comparar decentemente Federer e Laver se sao de epocas tao distintas ? O que da pra comparar e' _ quem sao os monstros de cada geracao, quantos Super Bowls cada um ganhou,e assim por diante. Valeu. Grande blog.

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  2. É como você disse, jogadores diferentes em épocas diferentes, as vezes até jogando jogos diferentes. É muito difícil você fazer uma comparação, muito menos usando algo tão simples como números. É uma questão muito mais complexa.

    E mesmo assim, as comparações podem ser difíceis. Por exemplo, Marino não tem nenhum anel, mas ainda considero ele o 2º melhor QB a pisar nesse planeta. Não é culpa dele que ele sempre tenha tido times medianos e tenha acabado sem títulos. O único time realmente bom que ele teve, 1984, foi o ano que ele chegou ao Super Bowl, onde infelizmente para ele enfrentou o ÚNICO QB que eu considero melhor que ele na história, Joe Montana. Então não da pra olhar só pros fatores pontuais, tem que olhar pra tudo que envolve a discussão: Época, estilo, companheiros, etc. É muita coisa pra conseguir fazer uma análise precisa.

    E obrigado pelos elogios! Grande abraço!

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  3. Salary cap era mandou um abraço ao Joe Montana.

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