Antoine Walker dança balé no garrafão do Mavs de 2006
Foram 82 jogos da temporada regular para cada time. Foram 15 jogos de playoffs, com 12 vitórias e três derrotas pra cada um dos dois. E agora, finalmente, Miami Heat e Dallas Mavericks estão prontos pra fazer a grande Final da temporada 2011 da NBA, começando hoje a noite, no AA Arena em Miami. E se esses dias eu disse que os times que foram eliminados nas finais de conferência, Bulls e Thunder, eram times bem parecidos, Mavericks e Heat são times bem diferentes em quase tudo. Mesmo assim, os dois tiveram um caminho difícil até aqui, cheio de problemas e dúvidas.
Os problemas do Miami Heat ao longo da temporada já foram muito comentados, inclusive por esse blog, que sempre olhou com desconfiança esse time de South Beat. Claro que (como eu também fazia questão de frizar a cada crítica) quando você tem dois dos cinco (dos três?) melhores jogadores da NBA no mesmo time esse time sem dúvida é candidato a ir bem, ganhar o título, descobrir a cura da AIDS e até fazer o Scottie Pippen fazer comentários idiotas comparando Lebron James ao Michael Jordan. Mas apesar de todo o talento (e de uma montagem de elenco que, tirando o Big Three, foi totalmente desastrosa, já que o Miami não tem outras moedas de troca e está comprometido com seis jogadores até 2016 que comem todo o teto salarial, mas que pelo menos cumpriu o papel de cercar o Big Three com 12 role players) o Miami demorou muito a se encontrar na temporada regular, não achou um bom equilíbrio entre suas três estrelas dentro de quadra e, apesar de muitos jogos dominantes, perdeu a maior parte dos confrontos contra equipes fortes. O excesso de jogadores com a mesma característica, a falta de jogadores decentes nas posições de armador e pivô e um ataque fraco de meia quadra (que também resultou numa incapacidade de decidir jogos) colocaram muitas dúvidas em cima do Miami Heat.
E não preciso nem comentar que nessa pós-temporada o Heat tem passado por cima de todas elas. Dominou o 76ers e mostrou pra um enfraquecido Celtics quem é o verdadeiro Big Three da atualidade nas primeiras rodadas, dois times incapazes de explorar as fraquezas do Miami Heat. E quando enfrentou o Chicago Bulls do MVP Derrick Rose e o primeiro time com garrafão realmente forte entre os que pegaram nos playoffs, as duas características que mais atrapalharam o Heat ao longo da temporada, o Miami simplesmente passou por cima do adversário. Tudo bem, o Heat demonstrou os problemas que a gente já conhecia em algumas horas - as vezes teve dificuldades em pontuar no garrafão pela falta de um pivô que atraia a marcação, o banco e a rotação não tem a menor lógica e as vezes o ataque passa por períodos de estagnação onde o Lebron fica forçando bolas longas - mas conseguiu contornar ou corrigir muito mais defeitos do que muita gente esperava, o jogo do time se elevou muito, pareceu ter encontrado um equilíbrio e parece que, depois de uma temporada regular muito conturbada, o Miami Heat finalmente está trazendo seu melhor basquete, com uma defesa insana e um ataque que - apesar dos defeitos que tem - usa e abusa do talento dos seus craques, que estão não só entrosados como envolvendo muito bem os companheiros. É um time que tem dois dos jogadores mais completos da Liga e está usando isso de forma a ganhar suas partidas com propriedade.
E do outro lado, o Mavericks foi um time que também teve uma temporada cheia de altos e baixos mas que, eu confesso, eu não esperava que se reerguesse nos playoffs, como por exemplo eu acreditava que seria o caso do Heat. O Mavericks foi uma das sensações do começo da temporada, tinha uma defesa por zona absurda e tinha um ataque bem balanceado com o Dirk Nowitzki em grande fase (Que já dura uns 10 anos). Mas aí vieram as lesões: Primeiro o Nowitzki perdeu alguns jogos e deixou o resto do time totalmente perdido, e depois a lesão definitiva do Caron Butler. Eu falei sobre o impacto dessa lesão antes da série entre Mavs e Blazers, sobre como o Mavericks perdia uma das suas válvulas de escape porque era único jogador do time que batia pra dentro, abria espaço e cavava faltas no garrafão. Sem ele, o time passou a ter apenas o Nowitzki como um jogador pra criar o próprio arremesso, o que as vezes tornava o Mavericks um time excessivamente estagnado e dependente do alemão. E isso se fez sentir muito ao longo de toda a temporada regular, era o Nowitzki jogando em nível MVP e o time ganhando por pouco, com dificuldade, mesmo de times medianos. Mas o Mavericks também superou tudo isso na prorrogação: O time começou a rodar a bola ainda melhor do que antes pra compensar a falta do Butler, o JJ Barea surgiu como uma ótima opção pra bater pra dentro do garrafão, a defesa continuou forte como sempre e o Dirk é simplesmente o cara. Depois de um sufoco e um quarto período patético, quando o Brandon Roy fez um dos melhores jogos da história recente dos playoffs, o time se acertou, perdeu apenas uma partida e ganhou todos- TODOS! - os jogos fora de casa que disputou. Varreu o Lakers, venceu meu candidato ao título do Oeste que era o Thunder, e agora ta lá na Final, mais uma vez.
Sobre o confronto em si, os dois times se enfrentaram duas vezes na temporada regular, com duas vitórias do Mavericks. E a gente já sabe que as derrotas do Heat na temporada regular são coisas que ficaram por lá, se fossemos seguir essa lógica o Heat nunca teria passado do Celtics, então não querem dizer nada. Mas a questão é que nelas o Mavericks demonstrou muito bem como defender o Miami Heat usando sua defesa por zona em mais do que um terço das posses de bola do adversário. A inconsistência nos chutes de longe do Lebron e do Dwyane Wade era mais explorada e com os ótimos defensores Tyson Chandler e Brandon Haywood o time impedia as cestas fáceis próximas à cesta, e o Miami Heat muitas vezes tentava apelar pra um exagero de jogadas individuais que resultavam em turnovers. Mas esses confrontos foram cedo, cedo demais, na temporada pra significarem muita coisa, ou pelo menos no que diz respeito à capacidade do Miami de reagir a ela. O Heat está trabalhando melhor a bola, tem uma variedade maior de jogadas que eles são capazes de executar à sua disposição e o Lebron está, talvez, na melhor fase da carreira.
Mas o fato é que o Dallas está muito confiante na sua habilidade de defender a grande zona de conforto do Miami, o garrafão. O Chandler fez um trabalho sensacional contra o LaMarcus Aldridge na primeira rodada e o time como um conjunto parou completamente o garrafão do Lakers e o Kobe Bryant quando tentou se aproximar do aro e mais tarde o Russell Westbrook e o Kevin Durant foram obrigados a tentar ganhar jogos de fora da área pintada. A velocidade lateral do Chandler e do Haywood combinada à defesa por zona torna o garrafão do Mavericks uma zona dificílima de se entrar, e se o Miami não conseguir se impor lá dentro a série vai ficar difícil pra eles. Eles não tem um pivô dominante (ou sequer decente ofensivamente) e o Chris Bosh não vai encontrar a facilidade que teve na série contra o Bulls, quando foi marcado pela peneira que é o Carlos Boozer e foi fundamental pro Heat furar a defesa de Chicago passando por cima do marcador como quis, quando quis e por onde quis. Por isso mais do que nunca o time vai depender das infiltrações do Lebron e do Wade e da capacidade deles de começarem as jogadas de dentro, não do perímetro. Eu podia citar que os dois vão precisar das bolas de três, mas isso seria idiota, já que eles vão acertar algumas e vão errar mais outras de qualquer forma, faz parte do jogo deles. Já o Mike Bibby e principalmente o Mike Miller tem como obrigação acertar as bolas que não acertaram até agora (Tirando um dos jogos contra o Bulls por parte do Miller) pra dar ao Heat uma opção a mais de forma a extender o cobertor da defesa do Mavs e tentar fazê-lo mais e mais curto. E, é claro, o Bosh vai ter que achar uma forma de produzir. Ele deitou e rolou contra o Boozer, e se mantiver o ritmo vai ser um jogador chave nessa série, mas o Nowitzki é um defensor muito melhor que o Boozer e as vezes o brontossauro de Miami vai ter que tentar passar por cima dos mais altos Chandler e Haywood. Sem o Bosh se estabelecendo, e com Lebron e Wade tendo que segurar a bola o tempo todo pra forçar as infiltrações, isso pode levar a arremessos mais contestados e previsíveis, matando a rotação de bola que tem sido muito boa até aqui e gerando turnovers e pontos fáceis nas mãos do Shawn Marion.
Do outro lado, a grande questão de qualquer série que envolva o Mavericks: Como parar o Dirk Nowitzki? Nas Finais de 2006, o Heat teve sucesso quando usou dois jogadores. Primeiro o Udonis Haslem, e depois e a meu ver muito mais eficientemente o James Posey. Os dois colocaram pra cima do Nowitzki uma marcação física, que não deu espaço pra ele jogar de meia distância e o forçaram a se aproximar mais da cesta - onde o Heat tinha dois paredões - ou então a forçar arremessos. Mas o Heat tem dois problemas se quiser repetir isso. Primeiro que não tem mais um jogador de marcação como o James Posey. O Posey é um excelente marcador, mais baixo que o alemão mas muito físico e ágil e que deixou o ala-pivô desconfortável, desequilibrado e isso acabou por tirá-lo do jogo que ele gosta, mas o Heat não tem nenhum jogador com essa combinação de força física e boa defesa de meia distância além, talvez, do Lebron James. Então vocês poderiam me falar "Ué, coloca o Haslem, deu certo uma vez.". Mas aí que entra o segundo e maior problema: O Nowitzki é, hoje, um jogador muito mais completo e muito melhor do que o das Finais de 2006. Ele joga melhor de costas pra cesta, infiltra muito melhor, tem um arsenal infinito de jogadas ofensivas e, principalmente, está muito mais confortável do que nunca passando a bola e acionando seus companheiros e sua ótima rotação de bolas no perímetro. Marcar o Dirk de perto, com o físico, não da mais tão certo porque ele não foge de contato, ele gira e parte em direção a cesta para uma enterrada ou uma falta, e se você der espaço a gente já sabe o que acontece. E a forma como ele conseguiu se inserir no esquema de jogo do Dallas (Falei mais sobre o assunto num post recente) e acionar seus companheiros sempre que recebe uma marcação dupla trouxe uma melhoria absurda no ataque de Dallas, que com isso abre muito mais espaços. O Heat provavelmente vai tentar usar o Haslem em alguns momentos, o Bosh em outros e provavelmente até o Lebron, mas eu não vejo o Bosh nem o Haslem capazes de defendê-lo eficientemente sem cometer um excesso de faltas ou atrair marcações duplas. O Lebron tem mais agilidade e muita força física, mas se o Bosh não for eficiente no ataque e deixar tudo a cargo de Wade e Lebron, e sobrecarregar o ex-MVP com isso pode destruir o plano de jogo ofensivo da equipe, além da possibilidade dele ter que sentar com faltas. Essa marcação deve mais ser usada como um recurso em momentos chaves da partida, como aconteceu com o Rose algumas vezes, mas em geral, o Heat vai ter que achar uma forma de contar o Dirk sem usá-lo.
Outro fator importante dessa série são os turnovers. Já comentei do lado do Dallas, mas o Miami é um time que vive pelos turnovers, tem um ataque de transição imparável, imarcável e inimitável e, contra uma defesa forte como a do Dallas, os contra ataques são a melhor e mais garantida forma de se pontuar. Por isso, naturalmente, o Dallas vai ter que evitar os turnovers, já que eu não vejo a defesa de transição do Dallas perto de parar Lebron e Wade correndo juntos quadra acima. O Jason Kidd é um dos melhores armadores do mundo e é muito inteligente, e a ele vai caber algumas vezes a função de cuidar da bola e evitar os turnovers, mas o Kidd não é um armador que fica o tempo todo com a bola na mão. O Dallas tem um ataque baseado em uma rápida e eficiente troca de passes e rotação de bola, o que vai dar ao Heat muitas oportunidades de conseguir roubos dignos do NBA 2k11 e sair correndo na transição. A posse de bola do Dallas, quando se dobra no Dirk, costuma rodar até achar um arremessador livre ou alguem cortando para a cesta ou próximo dela, e o Heat tem uma defesa rápida e atlética pra atrapalhar essa rotação e até conseguir alguns contra ataques. Se o Heat conseguir intimidar o Dallas nessas linhas de passe a ponto de deixá-los intimidados, a série está ganha. Se o Dallas evitar os turnovers, acionar bem o Nowitzki e rodar bem a bola - o que tem feito muito bem até aqui - o time tem uma boa chance, mas é bom lembrar que o Heat não vai disperdiçar lideranças no final das partidas como o Thunder cansou de fazer com péssimas posses de bola. E, de certa forma, o mesmo vale para o Heat, que não vai ter no Mavericks um time jovem que fica apavorado na hora de decidir e que acaba resultando num arremesso idiota vindo de uma isolação, vai ter um time veterano, que roda bem a bola e tem um jogador imarcável no Nowitzki. Vai ser uma grande série, e embora eu aposte no Heat, minha torcida vai parar o meu segundo jogador favorito, Dirk Nowitzki. Agora é sentar e curtir, que hoje 22h começa, com transmissão da ESPN.