Some people think football is a matter of life and death. I assure you, it's much more serious than that.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Preview NFL 2013 - San Francisco 49ers


Um dos 5 melhores momentos da minha vida


Nessa série de previews já falamos de 28 times diferentes, incluindo toda a AFC East, South, North e West e das NFC East, South e North. Hoje começamos a falar da NFC West. Você pode acessar todos os previews direto do nosso índice. Se você não tem ideia do que estou falando, recomendo que leia esse post introdutório. Btw, a falta de crases nesse texto é porque esse teclado não tem crase, então não reparem, ok?

San Francisco 49ers

2012 Record: 11-4-1
Ataque ajustado: 5th
Defesa ajustada: 2nd


Se voltarmos um instante para 2010 para olhar o cenário da NFC West em comparação com o resto da NFL, vamos lembrar de como a divisão era lamentável naquele momento. Não foi a toa que o nome NFC West virou sinônimo de piada na NFL: aquela divisão foi vencida por um Seattle Seahawks com record 7-9, a primeira vez na história da liga que um time vence uma divisão com record negativo E a primeira vez que um time com record negativo sediou um jogo de playoffs. Na verdade, aquele Seattle foi provavelmente o pior time da história do universo a sequer ir para os playoffs: um time 7-9 mas com Pythagorean Expectations de 5-5 vitórias e a terceira tabela mais fácil da NFL, aquele foi na verdade o terceiro PIOR time da liga pela estatística de eficiência ajustada do Football Outsiders, de longe a menor classificação para um time de playoffs desde que o Football Outsiders tem esse dado. Na verdade, para se ter uma noção de quão ruim a NFC West, em termos de eficiência ajustada seus quatro times estavam entre os 9 piores de toda a NFL: Cardinals ficou em último depois da aposentadoria do Kurt Warner; Seattle foi o terceiro pior e ainda ganhou um jogo de playoffs; Rams (que terminou 7-9 e perdeu a vaga para o Seahawks na última rodada) ficou em 27th; e o melhor time da divisão foi um 6-10 Niners que ficou em 24th e que mandou o técnico embora faltando duas rodadas. Foi um ano brutal que solidificou a reputação da NFC West como a piada da liga. Três anos depois, você pode fazer um argumento muito sólido que a divisão possui dois dos três melhores times da NFL e é a mais forte da liga. So... Yeah. As coisas mudaram um pouco desde então.

E essa mudança começou pelo San Francisco 49ers. A verdade é que, depois de perder os playoffs todo ano desde 2002 - sem sequer um 8-8 ou melhor entre esse período - por conta de má gestão, más decisões e basicamente uma franquia bagunçada, o time começou a dar a volta por cima em 2009. Antes da temporada, a franquia passou para Jed York, o filho milionário de 28 anos de John York (o antigo dono) e sobrinho do lendário Eddie DeBartolo (dono da equipe na época de ouro), algo que na época parecia uma bomba relógio com um milionário jovem e imaturo assumindo o comando do time e que acabou virando uma das melhores coisas que aconteceram a equipe em anos recentes (não existe na NFL atualmente três donos de times melhores que York). Aquela foi a melhor temporada do 49ers desde 2002, terminando 8-8 mas com o Pythagorean Expectations de 10-6, a quinta melhor defesa da NFL, o melhor ano da carreira de Alex Smith e uma performance defensiva extremamente dominante contra os atuais campeões da NFC Cardinals (um 24-9 no qual o Niners forçou sete turnovers e engoliu Warner e Larry Fitzgerald) que pareciam indicar uma melhora considerável em 2010 e, quem sabe, uma vaga nos playoffs. 

Não aconteceu. A temporada 2010 foi uma enorme decepção, com Mike Singletary ganhando o cinturão de "pior técnico da NFL" e mudando (para pior) quase toda a comissão técnica da equipe, Troy Smith e Alex Smith praticamente se revezando semanalmente na titularidade (algo péssimo para qualquer time) e tudo que podia dar errado, deu. Singletary foi mandado embora faltando ainda dois jogos para acabar o ano, e a "volta por cima" da equipe acabou em fiasco. Ou pelo menos por mais um ano. Naquela offseason, York e Trent Balkee (GM da equipe) foram buscar Jim Harbaugh em Stanford, e fazer um upgrade do pior técnico da NFL para um dos melhores pagou dividendos: o 49ers pulou de 6-10 para 13-3, transformou Alex Smith de "wow, esse cara foi um dos maiores busts da década" para "ganhei o jogo mais espetacular dos últimos anos faltando 7 segundos contra um ótimo time do Saints nos playoffs", ganhou o jogo mais espetacular dos últimos anos (nenhum jogo na minha vida foi melhor do que Saints-49ers em 2011. Nenhum) e chegou muuuuuuito perto do Super Bowl antes de perder na prorrogação para um excelente time do Giants. Um ano depois, com Colin Kaepernick no lugar de Smith, o 49ers repetiu sua boa campanha e esteve a uma falta não marcada e um erro da arbitragem nos segundos finais do Super Bowl de conseguir seu primeiro título em 18 anos. Então sim, foram dois anos bem diferentes do que os torcedores do 49ers estavam acostumados. Ou seja, divertidos. Mas vamos dar uma olhada mais de perto no que realmente funcionou para o Niners nesses dois últimos anos, e nos pontos importantes olhando para frente.

A reviravolta do 49ers começou na verdade alguns anos antes da chegada de Harbaugh, do lado defensivo da bola. Antes mesmo de Jim transformar Alex Smith em um bom QB titular e do ataque explodir de vez sob a batuta de Kaepernick, a defesa de San Fran já dava mostrar de ser um grupo de elite: A defesa terminou como a quinta melhor de 2009 e nono em 2010 apesar de nenhuma ajuda do ataque (más posições de campo, ataques que não precisavam se apressar e ser previsíveis, etc), e foi isso que deu esperanças para os torcedores. Se o Jets conseguiu chegar em duas finais de conferência com Mark Sanchez porque tinha um bom ataque terrestre e uma excelente defesa, porque não o Niners? Enquanto tivessem essa defesa, era possível (eventualmente foi o que aconteceu em 2011, mas chegaremos lá).

E a questão da defesa do 49ers não é que era apenas uma defesa boa, mas era uma defesa que intimidava. Extremamente física, com bons jogadores dando tackles e uma mentalidade de atingir os adversários com o máximo de força permitida pelas regras, é o tipo de defesa que ninguém gostava de enfrentar sabendo que ia tomar pancada toda vez que tocasse na bola, que sua linha ofensiva ia ser empurrada como um monte de sacos de areia, e que ia passar o jogo todo brigando para conseguir cada jarda. Era uma defesa cujo atrito desgastava qualquer ataque, fisica e psicologicamente, e isso acabou constituindo a identidade que o time quis montar. Não apenas na defesa, mas como um todo: um time mais forte e mais rápido do que qualquer outro, que joga mais fisicamente do que todos os demais.

Nos dois anos depois da chegada de Harbaugh, as coisas não mudaram: a defesa continuou sendo o grande ponto forte da equipe, 3rd em 2011 e 2nd em 2012, e com uma mesma abordagem: uma linha de frente dominante, intransponível contra corridas, e o resto encaixando em volta. A diferença é que, pela primeira vez com um técnico capaz de controlar o ataque e jogar de acordo com as forças e fraquezas de Alex Smith, a defesa começou a se ver numa situação privilegiada: com um ataque que evitava turnovers quase fanaticamente e com um dos melhores punters da NFL em Andy Lee, nenhuma defesa de 2011 viu os adversários começarem suas campanhas com pior posição de campo. A responsabilidade continuava alta, de levar nas costas um ataque eficiente mas pouco produtivo, mas pelo menos agora podia fazer isso com mais tempo, sem precisar enfrentar adversários que tinham o controle do placar e com posições de campo favoráveis. Não a toa a defesa subiu mais um nível, liderou a liga em turnovers forçados e foi a grande força por trás da excelente campanha de 13-3 da equipe. Em 2012, ainda mais do mesmo: os turnovers forçados caíram pois, como já disse aqui algumas vezes, uma temporada em nível muito alto nesse quesito costuma indicar regressão (Olá, Chicago!), mas não importou: ainda foi o segundo melhor grupo de toda a NFL depois do Bears, e mesmo com alguns problemas mais para o final do ano, ainda foi uma potência.

Para 2013, a defesa apresenta algumas questões interessantes: a equipe perdeu seu All-Pro (absurdo, mas enfim) safety Dashon Goldson para Tampa, seu NT Isaac Sopoaga para o Eagles, seu reserva para o Colts, e seu nickel corner Chris Culliver para um ACL. Em particular os dois primeiros deveriam ser sentidos, afinal eram jogadores titulares de alto nível, mas eu me pergunto se seria esse mesmo o caso. Uma vez, meu escritor favorito (Bill Simmons) criou uma Ringo Starr Theory, que diz que você não pode avaliar corretamente role players quando estão jogando com um jogador ou um grupo transcendental que eleva o nível de todo mundo. Parte de mim pergunta se não seria esse o caso com essa defesa do 49ers, especialmente considerando que todos os jogadores titulares desde 2009 que saíram da equipe pioraram consideravelmente em seus novos times: Nate Clemens saiu da equipe em 2010, e agora é um reserva no Bengals; Aubrayo Franklin era considerado o melhor NT da NFL quando saiu do time em 2011, foi para o Saints e nunca mais jogou em alto nível; Takeo Spikes quase foi ao Pro Bowl em 2010, um ano depois mal conseguia ser titular no Chargers e agora está sem time. Você não vai achar um único jogador importante da defesa do Niners que tenha saído no período e tenha tido o mesmo sucesso fora. Fato é que é mil vezes mais fácil se destacar e jogar em alto nível quando você está cercado de franchise players e Pro Bowlers executando diversas funções, forçando o ataque adversário a se ajustar e onde você pode focar em apenas algumas menores funções. Um safety que joga em Miami provavelmente vai ter maior responsabilidade contra o jogo terrestre do que um que joga em San Francisco com os dois melhores MLBs da NFL patrulhando o meio, permitindo que se foque na cobertura e nas interceptações, por exemplo. O mesmo é válido para um NT que tem Justin Smith do lado ocupando quinze bloqueadores, e por ai vai. Por isso eu acho que se preocupar demais com essas perdas é uma besteira, e esse foi o motivo que levou o 49ers a não se preocupar demais com essas perdas. Assim como um dos segredos da defesa do Steelers nos últimos anos foi sua capacidade de saber exatamente o que precisa de seus role players ao redor de um brilhante núcleo, o mesmo vale para o 49ers da atualidade. 

E sim, esse núcleo é brilhante. Eles possuem um dos melhores corpos de linebackers da história recente da NFL (me diga o último time dos últimos 20 anos a possuir três 1st Team All-Pro LBs e um 2nd Team. Você não vai conseguir) e possuem bons playmakers em posições chaves. A chegada de Nnamdi Asomugha (impressionante até aqui, ainda que a preseason não sirva para avaliar jogadores de fato) reforça uma secundária que foi suspeita em alguns momentos mas que conta com bons jogadores e deve ganhar um boost com a chegada do calouro Eric Reid. Mas sinceramente, o fato é que essa defesa consegue fazer de tudo sem ter que mudar de formações ou usar esquemas complexos: a linha de frente do seu esquema 3-4 é destrutiva o suficiente para colocar pressão no QB com pouca ou nenhuma ajuda de blitzes e não precisa de praticamente nenhuma ajuda extra para segurar as corridas adversárias, o que permite aos jogadores da secundária manterem suas funções sem precisar correr para ajudas. A secundária é um pouco mais suspeita, com alguns jogadores irregulares como Donte Whitney e Carlos Rodgers, mas ainda se beneficia enormemente do bom pash rush da equipe e principalmente das terceiras descidas longas que costuma enfrentar, já que os adversários não conseguem encurtá-las com boas corridas. Em um ano que eu (que vi todos os jogos da equipe) achei que a secundária não foi bem, ela ainda foi a 6th melhor ajustada da NFL (em parte por causa do calendário ridiculamente forte, terceiro pior da NFL). É a área de preocupação da equipe, mas enquanto a pressão continuar chegando, essa defesa vai continuar sendo uma força a ser reconhecida. Não tem porque isso mudar em 2013.

O ataque que é o ponto de interesse. No primeiro ano de Jim Harbaugh, o HC tentou estabelecer no 49ers o estilo de jogo que tinha dado certo no Jets nos dois anos anteriores: um time baseado em uma defesa extremamente potente, que forçava muitos turnovers, e um ataque conservador que corria muito com a bola, controlava o relógio, minimizava os erros, ganhava os duelos em termos de posição de campo e protegia seu QB titular. É basicamente um esquema extremamente conservador que tenta vencer a batalha por atrito, contando com sua defesa dominante e seu ataque conservador e eficiente. Apenas o Denver Broncos de Tim Tebow correu mais com a bola do que o Niners em 2011, e nenhum time foi melhor evitando turnovers. Junte a isso uma defesa que forçou mais turnovers que qualquer outra e um dos melhores técnicos da NFL (e a tabela mais fácil da liga) e o Niners terminou o ano 13-3, ganhou um jogo histórico do Saints na primeira rodada e esteve a dois fumbles de special teams de chegar ao Super Bowl. Em 2012, Alex Smith evoluiu muito e o ataque do 49ers estava entre os melhores da liga, embora ainda fosse essencialmente o mesmo ataque correr primeiro, correr segundo e passar depois. Até que Alex Smith se machucou durante uma partida contra o Rams, e Harbaugh colocou Kaepernick de titular.

A decisão de Jim Harbaugh de manter Kaepernick como seu titular e colocar no banco Alex Smith - 4th em QBR, 4th em produtividade por jogo na NFL até aquele ponto - tem que ser uma das mais corajosas dos últimos anos. Você tem um QB perfeitamente confiável, que conhece o playbook, tem funcionado muito bem sob seu comando e que evoluiu em relação ao "game manager" do ano anterior para um jogador que realmente ganhava jogos, e tem que decidir se o mantém ou se arrisca no moleque que ele mesmo chamou de "o melhor jogador do draft" antes do draft de 2011 e que escolheu a dedo para ser o QB do futuro da franquia, um jogador que entrou muito bem enquanto Smith não pode jogar e que parecia dar uma dimensão nova ao ataque do time com sua explosão física e passes profundos. Era uma decisão entre ir no seguro e no que estava dando certo, ou ir na direção mais arriscada e que tinha maior potencial futuro. Não tinha realmente uma decisão certa, era escolher uma e saber que iria responder pelos resultados. Harbaugh escolheu Kaepernick por um simples motivo: o ex-QB de Nevada oferecia a equipe uma chance maior de vencer. Como já insistimos um bilhão de vezes, o resultado de apenas um jogo tem muito de aleatório e é influenciado por diversos fatores, mas dentro deles, Jim acreditava que teria uma chance melhor de vencer com ele do que com Smith. E sabemos que é impossível fazer o jogo do "e se Smith tivesse jogado, teriam chegado ao Super Bowl?" para saber como as coisas seriam em outro cenário, então só posso dar minha opinião pessoal: de forma alguma o 49ers teria vencido um duelo de ataques contra Green Bay sem Kaepernick.

A manutenção de Kaepernick levanta algumas questões interessantes para o futuro da equipe. Se com Smith no comando o esperado era um ataque conservador e ultra-eficiente mas com potencial limitado, com Kaepernick isso muda totalmente de figura. O 49ers ainda tem todos os elementos de um grande ataque terrestre (3rd overall em 2012 com Kaepernick jogando menos de metade dos jogos) em um excelente grupo de RBs (liderado pelo underrated Frank Gore) e uma linha ofensiva de elite que está na conversa para ser a melhor da NFL. Junte a isso um dos melhores QBs correndo com a bola do mundo e que tem experiência jogando no option, e não existe nenhum motivo para acreditar que esse ataque terrestre espetacular do 49ers (terceiro na liga em jardas por corrida, segundo considerando apenas RBs) vá desacelerar em 2013. Na verdade, com aquele jogo de 181 jardas terrestres de Kaepernick queimado no cérebro de cada coordenador defensivo do planeta, o potencial desse ataque terrestre é ainda mais absurdo porque ele agora possui uma arma a mais para manter defesas confusas, então é muito possível (e talvez até provável) que o Niners continue sendo um ataque cuja principal força é o jogo terrestre.

A questão é que Kaepernick adiciona uma nova dimensão no jogo aérea. Se Smith era um QB conservador, Kaepernick é o exato oposto, um quarterback explosivo correndo com a bola que também possui um braço espetacular nos passes, impressionando tanto pela precisão como pela força. Contando apenas sua participação na temporada regular (vale citar que quebrou alguns muitos recordes nos playoffs), Kaepernick terminou a temporada terceiro em QBR, terceiro em produtividade ajustada (por jogo) e teria liderado a liga em jardas por passe se qualificasse para as estatísticas. Então o camisa 7 não é apenas um bom corredor, ele é um excelente passador, e o 49ers esteve muito confortável com ele comandando um ataque mais explosivo em 2012 apesar de não ter tido UMA jogada nos treinos como titular até a lesão de Smith. Mesmo assim o Niners terminou com o quinto melhor ataque aéreo (e geral) da NFL, então eu não consigo imaginar realmente qual será o potencial total desse ataque com uma temporada inteira de Kaepernick depois de uma offseason inteira como titular. Basta dizer que o potencial é muito maior do que com Alex Smith, e eu digo isso com dor no coração porque não existe maior fã do camisa 11 do que eu.

O ataque enfrenta apenas duas dúvidas. A primeira é sobre regressão: sim, Kaepernick foi fantástico em 2012, mas em uma amostra muito pequena. Será que esse é realmente seu nível, ou ele vai sofrer uma regressão enfrentando defesas mais preparadas e em uma amostra maior e mais considerável? É uma dúvida legítima e eu não tenho nenhum tipo de comentário contra ou a favor esse argumento, a única forma de saber é esperar uma amostra maior, mas Colin terá a seu favor o fato de poder contar com um ataque que vai muito além dele para não ser tão exposto logo cedo. Acho que esse é um problema menor, embora a dúvida seja real.

O segundo é mais problemático. O melhor WR da equipe, Michael Crabtree, sofreu uma ruptura do tendão de Aquiles e deve perder a maior parte da temporada (e não deve jogar 100% até 2014). Depois que Kaepernick assumiu o comando (inclusive playoffs), Crabtree foi o melhor WR da liga não apelidado "Megatron" e seus números projetados para 16 jogos com Kaepernick seriam de 100-1460-15 (recepções, jardas e TDs para quem não entende), que são espetaculares mesmo antes de lembrarmos que a tabela do 49ers nesse período foi particularmente insana em dificuldade. Mas se preferem algo mais prático, o camisa 15 era de longe o melhor WR desse elenco e, embora a chegada de Anquan Boldin vá ajudar consideravelmente a suprir essa carência na posição, ele não é Crabtree e isso deixa a maior fraqueza do time ainda mais problemática. Tirando Boldin, os outros WRs do elenco estão machucados (Crabtree, Mario Manningham), possuem pouca experiência (Quinton Patton) ou ainda precisam se provar na liga (Kyle Williams, Jon Baldwin, Marlon Moore, Lavelle Hawkins), então é um grupo sem nenhum outro recebedor confiável e com uma profundiddade questionável. O 49ers vai tentar compensar isso com um dos melhores TEs da NFL (Vernon Davis) e outro TE interessante no calouro Vance McDonald, mas para um time que contava em dar um salto com seu jogo aéreo, essa questão dos WRs pode ser um limitante importante. Os WRs da equipe na verdade foram muito bem na pré-temporada, mas isso não quer dizer que vá funcionar na temporada regular, são situações totalmente diferentes. Mas pode servir de consolo. Isso não quer dizer que o ataque não vá ser muito forte esse ano, ele ainda deve ser melhor que o bom ataque de 2013, mas limita um pouco o potencial.

E no final, é por isso tudo que o 49ers é um dos melhores e mais perigosos times da NFL. Sua força se baseia em uma excelente defesa E em um ótimo ataque que deve continuar em ascensão com uma temporada inteira de Kaepernick. Seu ataque pode tanto colocar em funcionamento seu excelente jogo terrestre como pode (ou espera-se que possa) vencer adversários pelo ar no volume de ataque. Apesar de algumas mudanças importantes (em especial, perder Goldson) ainda é provavelmente o time mais completo de toda a NFL, e talvez essa seja sua maior força: é um time que pode e possui os jogadores para jogar de qualquer forma ou com ênfase em qualquer estilo, e que tem talvez a melhor comissão técnica da liga para mexer os pauzinhos quando necessário. E no fundo, toda vez que penso que o 49ers possa ficar de fora dos playoffs (e é possível nessa NFC ridiculamente forte), eu lembro de que eles possuem um dos três melhores técnicos da NFL, um cara que ficou duas semanas (as duas últimas da temporada regular) sem usar nenhuma jogada de option ou pistol para tirá-la dos vídeos de estudo de Green Bay e surpreender o Packers nos playoffs (todo mundo viu o resultado), e que tirou do bolso um potencial Franchise QB quando ninguém esperava. O Niners tem uma das melhores defesas da NFL, pode ter um dos melhores ataques da NFL, e um dos três melhores técnicos na NFL. Mesmo com um calendário difícil, não consigo colocar esse time ganhando menos que 11 jogos. É talento demais. O 49ers passou de piada da liga a candidato ao título em dois anos, e não existe nenhum motivo para acreditar que irão parar por ai.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Preview NFL 2013 - Oakland Raiders

"Não acredito, o Raiders anotou um touchdown!!"



Nessa série de previews já falamos de 26 times diferentes, incluindo toda a AFC East, South e North e das NFC East, South e North, mais o Denver Broncos, o San Diego Chargers e o Kansas City Chiefs. Você pode acessar todos os previews direto do nosso índice. Se você não tem ideia do que estou falando, recomendo que leia esse post introdutório. Btw, a falta de crases nesse texto é porque esse teclado não tem crase, então não reparem, ok?

Oakland Raiders

2012 Record: 4-12
Ataque ajustado: 23rd
Defesa ajustada: 29th


Meu amigo Carlos essa semana veio me perguntar se eu achava que a situação do Raiders era semelhante a do Oakland Athletics no começo da década, e se para "salvar" a equipe seria necessário algum plano outside-the-box como o Moneyball. A pergunta dele se motivava em parte também pela questão financeira, já que o Raiders ainda divide seu estádio com o Athletics e nunca ganharia da cidade o tipo de ajuda financeira para um estádio novo que o Jaguars conseguiu, por exemplo. Então ele queria saber se essa consistente má fase do Raiders - a equipe não possui um record acima de 50% desde 2002 - teria algo a ver com alguma "desvantagem" financeira ou competitiva como no caso do Athletics.

Infelizmente não é o caso do Raiders, simplesmente porque não é o caso da NFL. Claro que em qualquer liga teremos times mais ricos ou menos ricos (a equipe nunca teria condições de construir um estádio de mais de 1 bilhão de patacas de uma hora para outra como o Cowboys fez, por exemplo), mas na NFL essa importância é minimizada, mais do que em qualquer outra liga do mundo: com um hard cap que vale igualmente para todos os times e, mais importante, com um sistema de redistribuição de renda (em termos de patrocínios ou cota de televisão) que garante a todos os times da liga dinheiro suficiente para cobrir os gastos com salários e afins, times ricos não possuem nenhum tipo de vantagem na hora de contratar jogadores em relação a times menos ricos, os dois podem oferecer os mesmos contratos com os mesmos limites e ambos possuem garantias de dinheiro da NFL para cobrir esses valores. Não existe nenhuma desvantagem competitiva por parte do Raiders como era o caso do Athletics, um time pobre jogando em uma liga sem teto salarial, sem limites em termos de contratos e sem nenhum tipo de redistribuição de renda. No caso dos A's, a única chance de ser competitivo para a equipe era desenvolver um conhecimento que nenhum outro time tinha para conseguir jogadores baratos. No caso do Raiders, isso sem dúvida ajudaria, mas não é o motivo pelo qual o time está nesse buraco faz tanto tempo. O motivo disso é pura e simples incompetência e má gestão. 

Vamos voltar alguns anos, para a época que o falecido Al Davis ainda era vivo e tomava todas as decisões (algo comum nessas ligas, btw: um dono de time que toma algumas boas decisões e acerta boa parte delas por um tempo, cresce demais o ego e começa a querer tomar todas as decisões sozinho mesmo quando elas param de funcionar). Mais especificamente, para o draft de 2009. O Raiders possuía a 7th pick daquele ano, e precisava urgente de um bom WR. Para sorte da equipe, esse foi um dos drafts com maior profundidade dos últimos anos, com uma dupla espetacular na frente (Michael Crabtree e Percy Harvin) e jogadores como Jeremy Maclin, Kenny Britt e Hakeem Nicks saindo na primeira rodada. Crabtree era o consenso de melhor WR - talvez melhor jogador - daquela classe, então não havia a menor dúvida de que ele sairia para Oakland (se não fosse pego antes). Ou era o que 99% das pessoas acreditavam. Al Davis tinha uma tara esquisita por jogadores velozes (o Raiders pegou o jogador com melhor tempo na corrida de 40 jardas por quatro anos seguidos, se não me engano), e nos workouts, o melhor tempo de 40y foi de um WR chamado Darrius Heyward-Bey, razoavelmente bem cotado mas nunca na classe de Crabtree/Harvin (esse último acabou caindo um pouco pelas lesões). Davis não se importou, ele queria o jogador rápido e pegou Bey antes de qualquer outro WR sair (com Crabtree caindo no colo do 49ers). Bey foi um bust e já está fora do time depois de ser dispensado, Crabtree e Harvin se tornaram dois dos melhores jovens WRs da NFL, e o Raiders saiu de mãos abanando desse draft.

Em 2010, o Raiders tinha a 8th pick e decidiu ir atrás de um MLB chamado Rolando McClain. McClain era bem cotado saindo do College, um jogador muito talentoso com problemas de comportamento/extra-campo que era considerado um jogador de alto risco, alta recompensa. O Raiders não precisava exatamente de um MLB na equipe (o que pra mim foi a prova de como foi uma escolha estúpida), mas decidiu pegar McClain. Três anos depois o jogador não está mais na NFL por conta de seus problemas extra-campo. Alguns jogadores que foram pegos com as picks seguintes aquele ano: CJ Spiller, Anthony Davis, Earl Thomas, Jason Pierre-Paul, Mike Iupati, Sean Weatherspoon. Mas espera, fica pior: um ano depois, vendo seu QB titular Jason Campbell basicamente ter mais um ano fraco (47.2 QBR), a equipe decidiu trocar não uma, mas DUAS escolhas altas de draft (uma de primeira e uma de segunda rodada, um absurdo) por um QB que estava afastado da sua própria equipe e já havia ameaçado se aposentar caso não fosse trocado e que não tinha uma boa temporada em quatro anos, Carson Palmer. Claro que o Raiders trocou uma escolha de primeira e segunda rodada por esse cara, que não foi horrível mas também não foi nada demais com um time fraco e dois anos depois foi - surpresa! - trocado por uma escolha de sexta rodada para o Cardinals. Boa forma de maximizar seus ativos, viu Raiders? 

No draft de 2011, o Raiders não tinha uma escolha de primeira rodada porque a tinha enviado para o Patriots pelo DT Richard Seymour, um excelente jogador que foi inútil no meio de um time tão ruim. Aquela pick virou Nate Soldier, um dos melhores jovens LTs da NFL. No de 2012, a 1st pick da equipe foi de Cincinnati pela estúpida troca de Palmer um ano antes, que virou Dre Kirkpatrick. A equipe também não tinha uma escolha de segunda rodada porque a trocou com New England por escolhas na terceira e quarta rodada, onde não tinha escolhas próprias: a terceira foi usada no Draft Complementar (vá direto ao último parágrafo para saber o que é isso) de 2011 para pegar o QB Terrelle Pryor, e a de quarta rodada foi trocada por Jason Campbell alguns anos antes (o mesmo QB que fez o time pensar "não aguento mais esse cara, vamos trocar duas escolhas altas por Carson Palmer!"). Nenhum dos dois jogadores selecionados com essas escolhas tiveram qualquer impacto até agora. Mas em 2012 a equipe trocou de GM (e Al Davis morreu um pouco antes), e em 2013 finalmente teve um bom draft, embora ainda sentisse os efeitos das más decisões de gestões anteriores (em especial a falta de uma escolha própria de segunda rodada, também com o Bengals - acabou virando o RB Giovani Bernard).

Finalmente o Raiders decidiu ir em uma nova direção com uma nova diretoria (Reggie McKenzie já era GM ano passado mas só agora ganhou pleno controle da equipe), mas não vai ser nada fácil. Eu imagino o Mark Davis (dono da equipe) chegando todo otimista no primeiro dia de training camp, olhando para os jogadores em campo e indo chorar no vestiário de desgosto. Entre os únicos bons jogadores da equipe, os que sobraram são Darren McFadden (muito bom RB quando saudável, o que nunca está), Jared Veldheer (melhor OL da equipe, pode perder toda a temporada com lesão), Marcel Reece (um bom FB mas que nunca vai fazer nada sozinho), Denarius Moore (um WR rápido e explosivo que idealmente seria o terceiro ou quarto WR em um bom time), Lamarr Houston (promissor, 4.5 sacks em 2012 como DE em uma defesa 3-4) e Charles Woodson (ídolo da equipe, mas já tem 36 anos vindo de uma temporada ruim em um bom time). Sério, são esses ai. McKenzie dispensou os outros jogadores da equipe que poderiam ser considerado "bons", mandando embora Richard Seymour, Michael Huff, Tommy Kelly, Bey e McClain, o que deixou a equipe ainda mais fraca. Não que eu o culpe o GM por um segundo: ele fez o que tinha que fazer para recomeçar, abrindo todo o espaço salarial que podia e se livrando de veteranos caros que não estariam por perto no próximo bom time da equipe. Foi a decisão certa visando o futuro, mas que vai deixar o time ainda pior para 2013. Eles já foram um time muito ruim em 2012 (4-12 sustentado pela sua Pythagorean Expectation, record em jogos decididos por uma posse de bola e sem nenhum grande indicador a favor de uma regressão positiva da equipe) e agora devem ser ainda pior em 2013, e se o ataque ajustado da equipe não foi tão abismal assim, é porque nenhum time da NFL produziu mais em garbage time (Carson Palmer foi titular do meu Garbage Time All-Stars de 2012). Então sim, a equipe foi horrível, e ainda se livrou de boa parte dos seus jogadores mais produtivos. Deve ser horrível novamente em 2013.

E ai eu pergunto... isso é uma coisa ruim? Para mim não. Pense no Oakland como um cara drogado por anos que entra em recuperação. Isso não vai acontecer de uma hora para outra, ele precisa primeiro limpar seu corpo da droga, se manter limpo por algumas semanas, passar a primeira fase de abstinência com um bom acompanhamento médico e conseguir se endireitar antes de sair por ai procurando empregos bem remunerados e tudo mais, certo? Para o Raiders não é diferente: em uma franquia tão destruída e poluída por anos de má gestão, essas temporadas 2012/2013 foram o primeiro passo na desintoxicação da franquia, se livrando dos seus contratos mais nocivos e jogadores que não correspondiam ao seu salário, abrindo espaço salarial e basicamente recomeçando a franquia quase do zero. Na NFL é muito difícil passar logo de uma fase horrível marcada por drafts ruins e contratos ainda piores para os playoffs, o Raiders precisava primeiro se livrar disso tudo para poder seguir em frente. E o preço a pagar vai ser mais um ano muito fraco.

Mas ai você lembra que o próximo draft possui duas excelentes comodidades: um possível franchise QB em Teddy Bridgewater e aquele que tem sido chamado de "o melhor defensor a sair do College nos últimos 10 anos", pass rusher Jadeveon Clowney (esse cara aqui). O Raiders pode ter perdido a loteria Andrew Luck/Robert Griffin, mas Bridgewater/Clowney é um bom prêmio de consolação, e não tem time na NFL em melhores condições de levar para casa um desses dois do que Oakland. Se você vai ser ruim por uma temporada, que pelo menos tenha um bom prêmio te esperando no final, não é mesmo? E se você já vai ser ruim essa temporada de qualquer jeito, porque não ser um pouco pior e aumentar suas chances de levar para casa o melhor prêmio? O Raiders precisa de tempo para colocar ordem na casa, e Clowney/Bridgewater é um bom ponto de partida.

E tem também a questão do QB em Oakland. A disputa atualmente está entre três jogadores: Matt Flynn, o cara que passou para 510 jardas e 5 TDs em um jogo por Green Bay mas mofou no banco de Seattle ano passado; Tyler Wilson, calouro de Arkansas; e Terrelle Pryor, o atlético e corredor QB de Ohio State que pouco fez em dois anos de profissional para nos convencer de que vai ser um bom titular. A verdade é que nenhum dos três é realmente uma boa opção no curto ou no médio prazo, embora nunca de para ter certeza de fato com jogadores que nunca realmente tiveram oportunidades na NFL (especialmente um calouro como Wilson). A vaga parecia garantida para Flynn, mas o ex-QB de Green Bay e Seattle teve problemas em seus jogos de pré-temporada e agora deve ficar parado uma semana com uma lesão no braço, abrindo as portas para Pryor ficar com a vaga (baseado em uma boa atuação em um segundo tempo de pré-temporada contra a defesa reserva de Chicago). Parte de mim pergunta se a idéia de Pryor ficar com QB é menos pela sua produção real para 2013 e mais por ser um prospect de alto risco e alta recompensa: se o alto risco prevalecer, ótimo, o time vai ser ruim e pegar uma escolha alta de draft. Se a alta recompensa falar mais alto, o Raiders pode ter achado seu QB do futuro e se dedicar a Clowney ou outro jogador não-QB de alto nível no draft. Para mim parece um win-win, e é por isso - não a lesão de Flynn, não o bom segundo tempo contra Chicago - que Pryor vai acabar sendo o titular para começar a temporada.

De novo, o que não é um problema. O time 4-12 de 2012 deve voltar ainda mais fraco, em uma divisão mais forte, e sem perspectivas imediatas de melhora por estatísticas que temos usado. Apenas Kansas City, Titans e Jaguars foram piores em 2012 (per Football Outsiders), e tanto Chiefs como Jaguars devem melhorar esse ano. McFadden é uma aposta para ficar saudável a essa altura, a incerteza com QB é grande e não devemos esperar muito de nenhum deles, e o corpo de recebedores está pior do que nunca. A defesa pode melhorar um pouco com as chegadas de Tracy Porter e Woodson, mas está ainda muito longe de se tornar uma defesa sequer decente, especialmente se DJ Hayden perder tempo machucado como se cogita. Sinceramente, é difícil ver como esse seria um time melhor em 2013 do que foi em 2012 a não ser que um QB exploda, e embora ele não tenha sido exatamente bom, Palmer pelo menos foi um jogador produtivo. Considerando que já foi um time muito ruim em 2012, não vai ser exatamente um ano divertido para torcedores do Raiders. Mas se existe um consolo aqui, é esse: pelo menos antes o Raiders era ruim atulhado de contratos ruins, jogadores caros e sem perspectiva de futuro. Agora ele é ruim com bastante espaço salarial, perspectiva de boas escolhas de draft e um futuro. E isso faz toda a diferença.



terça-feira, 27 de agosto de 2013

Preview NFL 2013 - Kansas City Chiefs


Cassell apontando para onde jogou seu último passe


Para saber do que estamos falando aqui e dessas estatísticas, recomendo a leitura desse post antes
Se quiser opinioes e analises sobre o Draft, voces podem ler o Running Diary da primeira rodada ou o manual de como avaliar um Draft na NFL


Nessa série de previews já falamos de 26 times diferentes, incluindo toda a AFC East, South e North e das NFC East, South e North, mais o Denver Broncos e o San Diego Chargers. Você pode acessar todos os previews direto do nosso índice. Se você não tem ideia do que estou falando, recomendo que leia esse post introdutório. Btw, a falta de crases nesse texto é porque esse teclado não tem crase, então não reparem, ok?

Kansas City Chiefs

2012 Record: 2-14
Ataque ajustado: 31st
Defesa ajustada: 30th


Caso ninguém tenha percebido ainda, muitas vezes eu aproveito esses previews para dissertar sobre alguns temas relacionados ao time, mas que não influenciam diretamente a temporada 2013 - eles simplesmente são interessantes. Falamos um pouco sobre como times inteligentes se comportam na offseason quando falamos do Ravens, falamos sobre porque times ruins continuam ruins quando falamos do Jaguars, dissertamos sobre regressão de outliers quando falamos do Vikings, sobre dúvidas com quarterbacks quando falamos do Eagles... e por aí vai. São todos relacionados o suficiente aos times para justificarem estar aqui, mas ao mesmo tempo são oportunidades para dissertar e explicar alguns temas que sempre se repetem na NFL e que portanto precisam ser explicados. No caso do Chiefs, a troca de QBs que a equipe fez na offseason é uma excelente deixa para explicar mais sobre o draft, e porque existe tanta incerteza nesse evento tão importante.

Hoje em dia, as pessoas adoram julgar qualquer tipo de coisa pelo resultado. Se o resultado foi bom, então tal time fez o certo, e se o resultado foi ruim, é porque a decisão tomada foi errada e a culpa é de quem a tomou. Essa visão é comum hoje, mas extremamente limitada, porque existe um milhão de variáveis influenciando diretamente o resultado que estão além do controle (ou dentro do controle, mas não relacionadas a questão inicial) da equipe, do técnico ou do GM que tomou tal decisão. Por isso é muito mais importante avaliar o processo de tomada de decisão antes de olhar para o resultado... o que claro, todo mundo ignora, já que concluir tudo a partir do resultado é mil vezes mais fácil. E o draft não é exceção: nós julgamos praticamente tudo só pelo resultado que eles geram (e as vezes esse resultado É motivado por boas decisões e excelente avaliação de jogadores mesmo) quando nem sempre é a melhor forma. O 49ers escolher Colin Kaepernick na segunda rodada não foi um acaso, ele era o alvo da equipe desde o começo, só que Trent Balkee entende que ele precisa maximizar o valor de cada escolha ao invés de pular logo no jogador que ele quer, então esperou até a segunda rodada para subir algumas picks e atingir seu alvo. Da mesma forma, não podemos culpar o Jaguars por escolher Blaine Gabbert apesar do garoto não ter dado certo (ainda) na NFL: Gabbert era considerado um QB top naquele draft, o Jaguars precisava de um QB e portanto a decisão fez sentido. Deu errado, mas foi uma boa decisão. Heck, eu até escrevi um post inteiro sobre como avaliar um draft pelo processo e não pelos resultados.

Aonde eu quero chegar com isso? No novo quarterback do Kansas City Chiefs, Alex Smith, primeira escolha do draft em 2005. Smith sempre foi universalmente reconhecido como um bust antes da sua temporada 2011 por ter sido a primeira escolha do draft e nunca ter sido um Franchise QB... ou mesmo um bom QB até a chegada de Jim Harbaugh. E para piorar a vida de Smith, 23 escolhas depois o Green Bay Packers selecionou Aaron Rodgers, que acabou virando o melhor QB da NFL na atualidade, o que deu ainda mais crédito para o argumento de "o Niners errou feio escolhendo Smith ao invés de Rodgers". Afinal, o resultado foi esse: Alex Smith não foi um bom jogador por seis anos e Rodgers virou o melhor da NFL. E isso que importa. Certo?

Bom, para responder a essa pergunta, vamos voltar para 2005. O 49ers tinha a primeira escolha do draft e precisava desesperadamente de um QB, só que nesse draft não havia nenhum consenso sobre qual seria o melhor jogador. Dois QBs se destacaram como os dois melhores desse ano, Smith e Rodgers, mas nenhum era cotado como melhor que o outro e era uma decisão pessoal. Mas o péssimo HC de SF, Mike Nolan, decidiu que queria Smith porque Rodgers tinha uma personalidade mais forte e ele não queria outro jogador para tirar a liderança dele sobre o elenco (caso você esteja se perguntando, sim, esse é uma motivação horrível para escolher um jogador com a 1st pick e não a toa Nolan não achou outro emprego de HC depois). Então o Niners pegou Smith e Rodgers (nativo da Califórnia e torcedor do 49ers desde pequeno) caiu para o Packers na 24th pick. E ai está a parte que todo mundo ignora: um jogador pego no Draft não é um produto finalizado. Ele ainda tem que passar por diversas adaptações, aprender um esquema tático, e encaixar em um time totalmente novo, e isso nem sempre acontece igual para todos os jogadores. E isso importa muito.

Então quais foram os caminhos de Alex Smith e Aaron Rodgers, uma vez na NFL? Smith foi jogado no fogo logo de cara, sendo o titular em um time horrível que não tinha uma linha para protegê-lo e nem recebedores para ajudá-lo, teve que se virar praticamente sozinho correndo de sacks e acertando recebedores que não se livravam de marcação, nunca teve calma ou estabilidade para desenvolver as partes ainda não desenvolvidas do seu jogo e acabou desenvolvendo alguns hábitos ruins no processo (principalmente arremessar apoiado no pé de trás). Ele nunca teve um bom técnico ou coordenador ofensivo que montasse um ataque em torno de suas forças ou fraquezas, e nunca teve um bom mentor para lhe ensinar os truques do jogo. Ele teve na verdade sete coordenadores ofensivos em sete anos, e portanto nunca teve muito tempo para estudar e se adaptar a um playbook ou estilo de jogo já que era constantemente mudado. O excesso de pancadas atrás dessa horrível linha ofensiva lhe causou lesões no ombro que lhe tiraram um ano e meio de aprendizado e evolução e o obrigou a ficar praticamente parado perdendo tempo que poderia estar usando para evouir. Enquanto isso, A-Rod entrou na situação mais confortável possível: ficou três anos na reserva aperfeiçoando e lapidando seu jogo, acostumando a essa nova realidade e evoluindo e corrigindo seus defeitos como passador. Ele jogou no mesmo playbook durante esses três anos, então sempre soube a perfeição o ataque no qual estava, e passou esses três anos aprendendo com um Hall of Famer de titular que lhe ensinava nos treinos. Quando finalmente assumiu a posição, Rodgers tinha polido suas habilidades ao máximo, dominava totalmente o playbook e entrou em um ataque extremamente bem montado e estável em torno dele. Agora me digam, qual dos QBs teve a maior chance de sucesso? Claro que foi Rodgers. Tudo que aconteceu com Smith foi o pior cenário e com Rodgers, o melhor. E isso está totalmente fora do controle de ambos, mas está totalmente relacionado com o resultado final que vemos hoje. Então sim, Rodgers provavelmente era melhor que Smith desde o começo, mas se o 49ers tivesse pego Rodgers e Smith fosse para o Packers, não existe a menor chance da carreira dos dois ter acabado da mesma forma: Rodgers nunca teria evoluido nesse super QB se tivesse sido jogado na mesma situação que Smith, e atrás de Brett Favre e com paciência e calma para se desenvolver, Smith teria tido uma carreira muito melhor e mais estável. Provavelmente nunca seria o jogador que Rodgers é, mas não seria aquele bust por seis anos. Tudo depende do contexto, e portanto é errado julgar as coisas pelo resultado. Espero ter deixado isso claro.

Mas de volta a Kansas City, a grande preocupação para o Chiefs, nesse primeiro momento, tem a ver exatamente com Smith: qual Alex Smith eles estão recebendo? O Alex Smith entre 2005 e 2010, incapaz de proteger a bola, sem força no braço e que não compensava isso com um bom aproveitamento nos passes e era basicamente um QB nível Matt Cassell (QBR nunca acima de 42.0)... ou o Alex Smith pós-Jim Harbaugh, o quarterback ultra-inteligente que dominava perfeitamente seu esquema ofensivo (voltado para suas forças e fraquezas), controlava o relógio, protegia a bola, ultra-eficiente que tinha o melhor aproveitamento de passes (71%) na NFL antes de se machucar? Sabia que Smith terminou a temporada 2012 com o sétimo maior QBR da liga e 10th em produção por jogo (Kaepernick terminou em terceiro em ambos, btw)? Apesar do óbvio efeito Harbaugh e jogar em um esquema que maximizava seus talentos, Alex Smith foi um excelente QB em 2012, um jogador que executou perfeitamente seu papel e maximizou as chances de sua equipe. Andy Reid, o novo técnico da equipe, claramente acredita que esse segundo Smith é quem está vindo para Kansas City para mandar uma escolha de segunda rodada por ele. O maior salto que um time pode dar de um ano a outro é um upgrade em termos de QB (falamos nisso no preview do Colts), e considerando que os QBs de Kansas ano passado foram Matt Cassell (36.57 de QBR) e Brady Quinn (27.4), Alex Smith já é um belo upgrade.

Mas claro, ele sozinho não vai ser suficiente para tirar Kansas desse buraco 2-14 que, inclusive, é sustentado pela sua Pythagorean Expectations (2.5-13.5) e tendo ido 2-3 em jogos decididos por uma posse de bola. Mas sabe o que é realmente estranho? Eu nunca vi um time tão ruim que nem esse Chiefs que joga com tantos jogadores excelentes!! Eles possuem um dos melhores RBs da liga em Jamaal Charles (quando saudável, mas enfim), uma boa linha ofensiva (que melhora ainda mais com a chegada de Eric Fisher) e um bom WR em Dwyane Bowe. Na defesa é ainda melhor, porque eles tiveram quatro Pro Bowlers e mais um bom número de jogadores jovens como Dontari Poe e Brandon Flowers. Na verdade, o time como um todo teve SEIS Pro Bowlers e mesmo assim foi 2-14 sem nenhum grande indicador de azar (tirando o fato de ter sido o terceiro pior time recuperando fumbles, 33%), como diabos explicar isso? Técnico ruim? Entrosamento? Fatores ocultos? Macumba? Eu não faço a menor idéia.

Talvez por isso esse preview seja tão interessante e tão difícil de escrever. Quando falamos do Lions, apontamos que praticamente todos os fatores possíveis e imagináveis apontavam, estatisticamente, para um 2012 muito abaixo do nível normal da equipe e que tudo indicava uma enorme reviravolta em 2013.  Isso não acontece no caso do Chiefs, onde tanto a PE como record em jogos decididos por uma posse de bola mostram que a equipe foi tão ruim quanto pareceu ser (Chiefs também foi o pior time pela eficiência ajustada do Football Outsiders)! Alguns fatores (chegaremos neles) estatísticos que temos usado realmente indicam alguma evolução, mas na verdade a maior parte da volta por cima que podemos esperar do Chiefs vem do senso comum, de parar e pensar que um time com tanto talento e tanto potencial não possa de forma realista repetir uma performance tão abismal como essa. De certa forma isso contraria um pouco a idéia dessa série, que é partir das estatísticas, mas alguns times sofrem tantas mudanças e dão sinais de serem tão diferentes ano a ano que temos que partir um pouco para a análise tradicional e experiência desses 12 anos de NFL (claro que temos usado também esse tipo de análise, ele é indispensável, mas nesse caso ele é ainda mais marcante). 

Primeiro, vamos deixar claro que existe alguns indicadores sim que mostram que o Chiefs vai melhorar para 2013, embora nenhum explique ou justifique como esse time com tanto talento foi tão mal em 2012. Já demos uma amostra do primeiro, que foi o problema dos fumbles: Kansas City foi o terceiro pior time da NFL, recuperando apenas 33% de seus fumbles. A defesa foi particularmente ruim, recuperando apenas cinco o ano inteiro (31%), e isso sem dúvida contribuiu para o saldo de turnovers da equipe de -24, pior marca da liga. Eu acho que não preciso dizer que, historicamente, um patamar tão alto assim é insustentável ano a ano por causa dos fatores que precisam estar em ação para chegar nisso, mas colocando um pouco mais de raciocínio, qual a chance de um ataque com Alex Smith (o QB mais conservador da NFL e o melhor protegendo a bola) gerar 20 interceptações e mais uns oito fumbles em sacks? É impossível que o Chiefs repita essa performance abismal nos turnovers, a equipe vai recuperar muito mais e o ataque vai oferecer muito menos. E só isso já é motivo de muito otimismo. Vale citar também que o Chiefs deve ter talvez a tabela mais fácil de toda a NFL, enfrentando AFC South, NFC East, Bills, Browns, e mais quatro jogos contra Chargers e Raiders. Então razões práticas para otimismo na região nós temos.

Mas a parte teórica é muito, muito maior. Começando pela mudança de técnico, onde o Chiefs mandou embora Romeo Crennel (segundo pior técnico de 2012 pela minha lista na frente de Pat Shurmur) e trouxe o bom Andy Reid da Philadelphia. Eu defendi a saída de Reid do Eagles pelo simples desgaste gerado entre time, técnico e torcida, e para um time que ia recomeçar do zero era melhor fazê-lo com um técnico novo e vida nova (senão os resultados de Reid sempre seriam julgados pelo passado), mas a morsa favorita da NFL ainda é um excelente técnico que também vai se beneficiar enormemente de um novo cenário e um time tão talentoso. É sempre difícil julgar uma troca de técnicos, mas trocar um tão ruim como Crennel por um tão reconhecido como Reid não pode ser ignorado, é um upgrade massivo que com certeza vai se refletir na equipe. O outro upgrade imenso que já comentamos foi de QB: Smith provavelmente não será o QB de elite que foi em 2012 fora do esquema do Niners e longe de Jim Harbaugh, mas ainda assim se for um quarterback "bom" ou mesmo "acima da média", já é uma melhora em relação ao patamar "cataclisma ambulante" de Cassell e Quinn em 2012. Reid também é famoso pelo seu bom trabalho com QBs e tem cobiçado Smith desde seus dias na Pensilvânia, então é de se esperar que pelo menos Smith mantenha um nível acima da média. E "acima da média" já é melhor do que o Chiefs tem de QB desde... hmm... desde... Trent Green em 2005? Yeekes!

A equipe também se reforçou ofensivamente de forma a melhorar as chances de um QB como Smith ter sucesso. Com Jamal Charles saudável e a chegada da primeira escolha do draft, Eric Fisher, o Chiefs deve ter uma boa combinação RB/linha ofensiva para estabelecer o jogo terrestre como foco do ataque da forma que Smith rendeu em SF: conversões mais curtas, muito play action, passes de alto aproveitamento e defesas mais equipadas para parar a corrida. A chegada de Fisher também aumenta a proteção que Smith vai ter, o que sempre é bom. Ainda é cedo para ver como Reid vai usar Smith em KC, mas pelo menos os primeiros sinais indicam que será de forma semelhante ao que o Niners fez: forte ataque terrestre, passes conservadores e muito missdirection. Tenho minhas dúvidas se o corpo de recebedores vai ser bom o suficiente para dar conta sendo que o único bom WR deles (Bowe) é um jogador mais de velocidade (eu gosto de Donnie Avery mas ele precisa ficar saudável), mas qualquer coisa é melhor do que o fiasco histórico do ano passado. Então não sei se o ataque vai ser bom, mas com certeza vai ser bem melhor. 

Mas é na defesa que o potencial é muito maior, apesar do fato de que inexplicavelmente o grupo terminou como a terceira pior de 2013. Realmente, no papel, é um dos grupos com mais talento na NFL: um NT (Poe) que é um candidato forte a explodir indo para seu segundo ano; um grupo de linebackers com três Pro Bowlers (Tampa Bali e Justin Houston - 19.5 sacks combinados em 2012 - pelas pontas e Derrick Johnson pelo meio); e uma secundária com o melhor jovem safety da liga em Eric Berry e um sólido CB em Brandon Flowers. Além disso, a equipe manteve esse núcleo junto e ADICIONOU mais quatro peças importantes, com Mike DeVito na linha defensiva junto a Poe, Akeem Jordan para fazer par com Johnson no meio da defesa (3-4), e DOIS excelentes reforços para a secundária em Dunta Robinson (excelente CB que vai assumir a responsabilidade de defender o melhor WR adversário de Flowers) e mais o Sean Smith do Dolphins para fazer a função de nickel, o que faz a secundária passar de "suspeita" para "transbordando talento". Basicamente a equipe tem um núcleo titular de sete defensores de alto nível e mais pelo menos quatro peças de reposição ou situacionais que poderiam jogar de titular em outros times. Esquecendo por um instante que foi a terceira pior defesa de 2012... bom, é uma ótima defesa, certo? É a mesma base que foi a 13th melhor defesa de 2011 e que só melhorou no papel desde então, adicionando novos e jovens playmakers. Não faz o MENOR sentido que esse grupo tenha sido tão mal quanto foi ano passado, e eu não consigo esperar nada além de uma grande reviravolta para voltar a metade superior da liga, talvez mesmo um Top10 (de novo, 13th melhor dois anos atrás, os jovens jogadores evoluiram consideravelmente, adicionou mais quatro bons playmakers desde então, melhor sorte com fumbles...). Não existe nenhum dado dizendo isso, mas olhe de novo para essa base e para os números de 2011 e é difícil NÃO concluir que 2012 foi uma aberração. A defesa vai dar a volta por cima. Ela tem que dar.

É bem difícil estimar exatamente o quanto isso vai resultar em uma melhora dentro de campo. O Chiefs vai melhorar consideravelmente, mas quanto? Hmm... eu não sei. Eu realmente não sei. O ataque deve melhorar nem que seja um pouco com a chegada de um QB competente e de um bom técnico ofensivo, uma OL mais sólida (não foi exatamente ruim ano passado, mas melhorou) e sem entregar tanto a bola para o adversário com fumbles e interceptações (o índice de interceptacões dos QBs do Chiefs em 2012 foi de 4.2%, o de Alex Smith foi 1.1% em 2011 e menos de 1.5% nos dois últimos combinados), o que vai ser crucial para estabilizar esse ataque horrível do Chiefs. E enquanto isso, a defesa deve dar um enorme salto de produtividade pelos fatores palpáveis e até alguns nem tanto (com menos TOs e um ataque melhor a defesa vai precisar jogar menos e ficar menos cansada, vai enfrentar adversários com pior posição de campo, etc), mas o resultado com certeza vai ser imensamente positivo. Junte a isso o efeito de um novo técnico e de uma tabela que pode muito bem ser a mais fácil da NFL, e eu confesso que me sinto bem otimista quanto a uma volta por cima de Kansas City. Playoffs ainda podem estar um pouco distantes já que o potencial ofensivo é um tanto limitado (a não ser que Smith realmente consiga carregar sua temporada 2012 para Kansas, mas eu acho difícil sem Jim), mas algo como 8-8 ou 7-9 me parece perfeitamente dentro do alcance dessa equipe. E convenhamos, faz mais sentido do que um time com seis ou sete Pro Bowlers terminando 2-14 com o 14th pior saldo de pontos dos últimos 25 anos. No aguardo do que esse time tem a oferecer para a temporada.