Some people think football is a matter of life and death. I assure you, it's much more serious than that.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Os Campeões do Mundo

Pela primeira vez, esse troféu vai pra San Francisco

Sei que ficou gigante denovo o post, mas é um post sério sobre um título de MLB. Pra quem tiver paciencia de ler, eu recomendo, achei que ficou muito bom. Pra quem nao tiver, amanha volto a falar sobre NFL. Obrigado pela compreensão.
Noite de 26 de dezembro de 2009, um Toyota alugado atravessa a Bay Bridge pra entrar em San Francisco. Dentro do carro, dois torcedores do San Francisco 49ers fanáticos chegavam com a familia à cidade onde, dia seguinte, realizariam o sonho de ver seu time jogar ao vivo. Passando perto da baía pra ver melhor a cidade no escuro, uma construção aberta que emitia forte iluminação chamou a atenção do carro. Era um estádio onde se podia ler num letreiro luminoso "AT&T Park". Chegando ao hotel e acessando o Wi-Fi de la, descobriram que era o estádio era do San Francisco Giants, um time fraco da MLB que ha anos nao obtinha sucesso.



No dia seguinte, indo pro Candlestick Park pra ver Niners vs Lions, os dois passaram em frente a uma interessante e bonita construção de tijolos, com duas estátuas (Que depois descobriram ser cinco no total) na frente, estilo antigo. O motorista do carro informou que era o AT&T Park, e avisou que o time era um fracasso desde que se mudou de New York e que nao ganhava um titulo desde 1954. Um deles, o mais velho, virou para o outro e brincou falando que agora que tinhamos passado por ali, seria a hora do Giants se reerguer e ser campeão, e que quando começasse a temporada da MLB os dois iriam acompanhar aquele time. San Francisco é a cidade americada favorita dos dois, os dois sao fanáticos por outro time da cidade (49ers) e o estádio era extremamente simpatico, e os dois prometeram que acompanhariam a temporada do Giants.



Um desses torcedores era meu pai. O outro, eu. Naquele dia, de volta do jogo (Niners venceram 20 a 6), fiz questão de passar pelo AT&T Park denovo. Vi a parte que estava aberta, a estátua do Willie Mays, a homenagem ao Jackie Robinson, e comprei um boné do time. Aprendi mais sobre a franquia e decidi que, se os Red Sox nao fossem ser campeões, eu iria torcer pro Giants. Eu prometi que em caso de titulo do Giants eu iria contar um pouco da minha historia com o time, e ai está ela. Pode parecer idiota, gostar do time só porque simpatizei com o estádio, mas nao é só isso. Ja estive em estadios ou ginásios de cinco esportes diferentes em sete países e nao achei nenhum que eu gostasse tanto quanto esse alem do Morumbi. San Francisco sempre foi minha cidade favorita dos EUA e eu senti muito bem, na viagem, o clima que a cidade tinha com o baseball, e caso algum dia voces forem pra la e sentirem o baseball na alma da cidade, é dificil nao se apaixonar. E agora estou aqui, vendo MNF e escrevendo sobre o título do Giants que meu pai falou ha dez meses de brincadeira enquanto passavamos na frente do estádio que hoje estará lotado pra receber os campeões.

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Algumas coisas parecem que são escritas pra acontecer. Nao importa se a lógica indicava o contrário, se as chances era pequenas. Na hora de acontecer, tudo acontece certo para esse fim, e pra quem ve do final parece que, desde o começo, os Giants estavam destinados a ganhar a World Series.

Para quem olhasse o time do Giants no começo da temporada, era dificil acreditar em alguma coisa vinda dali. Todos sabiam o que esperar de Tim Lincecum, bi campeão do Cy Young, premio de melhor pitcher, da NL, e do jovem mas talentoso corpo de arremessadores do time: Matt Cain, Barry Zito, Jonathan Sanchez. No entanto, não se podia esperar nada do resto do time. Era um grupo montado às pressas, com as sobras dos outros times, jogadores dispensados, velhos, sem perspectivas de um futuro na Major League.

Aubrey Huff estava sem time no meio de janeiro e assinou com o Giants um contrato condicional (dependendo de condições fisicas) de apenas um ano. Edgar Renteria sofreu com contusões durante todo o ano, jogou menos de metade da temporada, estava velho, com o corpo debilitado, desacreditado, e muitos - inclusive pessoas dentro do próprio Giants - acreditavam que ele deveria se aposentar, ou que o time deveria forçá-lo a isso. Cody Ross foi dispensado pelo Florida Marlins no meio da temporada (Agosto) e pego de ultima hora pelo Giants apenas pra evitar que seu rival San Diego Padres o pegasse. Buster Posey era um calouro que tinha passado dois anos nas Ligas menores e só foi chamado ao time no finalzinho e maio, e só virou titular no final de junho. Pat Burrell foi pego da Free Agency pelo Giants pra jogar pela sua franquia das Ligas menores e só foi chamado pro time em junho.

O Giants teve uma campanha bastante irregular, como a montagem desse elenco denunciava. Ganhava seus jogos com placares baixos, era um time varias vezes incapaz de anotar corridas e perdia mesmo quando um bom pitcher segurava o adversário a apenas uma corrida. O time rapidamente ficou pra trás do San Diego Padres na divisão e de Philadelphia Phillies e Saint Louis Cardinals pelo Wild Card. Era claro que o time, apesar de ter uma rotação sensacional, não tinha nenhum ataque, eram apenas pessoas esquecidas, velhas, desconhecidas que foram colocadas juntas com um bastão na mão. Chegado setembro, o Giants tinha 6,5 jogos de diferença pra tirar do Padres, e se conseguisse seria a quinta maior diferença tirada pra ganhar a divisão na história nesse periodo de tempo. Depois de um agosto sofrivel do time inteiro e principalmente do ace Tim Lincecum (jogando lesionado), o time se transfigurou em setembro. Lincecum foi um monstro, Buster Posey jogou mais do que qualquer outro jogador da MLB, o ataque encaixou suas rebatidas, o Padres inexplicavelmente parou de jogar bem, e no final o Giants acabou uma vitória à frente do rival Padres.

Mas na pós temporada o cenário da Major League muda totalmente. Não tem mais jogo facil. O Giants chegou cotado como um time que se superou para chegar ali, mas que nao tinha chances reais de título. Um bando de veteranos em decadencia e alguns jovens talentos foram o suficiente pra levar o time até os playoffs, mais nada.

Mas por sorte, o Giants enfrentou de cara um time que estava na mesma situação que ele e que tinha exatamente as mesmas armas: Uma rotação forte, bons arremessadores, mas um ataque deficiente liderado por um bom novato. Acontece que tanto a rotação como o ataque como o calouro não eram tao bons quanto os do Giants. Depois de Lincecum e Cain terem fechado os jogos 1 e 2 sem ceder corridas impulsionadas (Lincecum com uma atuação monstruosa de 2 hits e 14 strikeouts), o Giants fechou a série em quatro jogos (A semifinal de conferência é melhor de cinco). A série serviu pra mostrar as forças e fraquezas tanto faladas antes: Pitching excepcional e um ataque deficiente e as vezes incapaz de acertar as rebatidas quando era necessário.

O adversário seguinte era o temido Phillies, melhor time de MLB na temporada regular, com a rotação considerada a mais forte da MLB com Roy Halladay (Favorito ao premio Cy Young desse ano), Roy Oswalt e Cole Hammels e um ataque infernal liderado por Jayson Werth e Ryan Howard. A rotação titular do Giants era o ponto forte mas muito falaram que a do Phillies era tão forte quanto - se não mais forte. E o ataque não tinha comparação, o Phillies tinha um dos melhores ataques da Liga.

Foi ai que talvez aquele 'destino' começasse a aparecer. Cody Ross, dispensado no fim do campeonato sem cerimonia e pego apenas pra atrapalhar os planos do rival, acertou dois Home Runs em cima de Halladay e um em cima de Oswalt. O ataque do Giants destrinchou perfeitamente a chamada 'melhor rotação' da MLB. Aquele ataque anêmico e sem força pros playoffs estava destruindo Hammels, Oswalt, Halladay como se enfrentassem o Baltimore Orioles. A rotação do Giants e principalmente Brian Wilson foram sensacionais contra aquele poderoso ataque, e o time passou pelos Phillies mostrando uma clara superioridade dentro de campo, uma superioridade que nao existiria fora dele.

A World Series foi apenas uma repetição. O ataque do Giants subiu mais um nivel. As rebatidas vieram na hora certa. E os arremessadores do time foram absolutamente dominantes. Madison Bumgarner e Cain zeraram os Rangers. E Tim Lincecum venceu duas vezes o monstro Cliff Lee. Edgar Renteria., Aubrey Huff e Juan Uribe mandaram a bola pro outro lado do muro quando precisaram. E os Giants agora são os campeões!!

Pra mim, a jogada emblematica do título foi no jogo dois. O jogo estava zero a zero, e na parte de cima da quinta entrada, Ian Kinsler no bastão enfrentava Matt Cain. Kinsler mandou uma cacetada alta pro fundo do campo. A bola viajou, bateu na parte de cima do muro, subiu e... caiu do lado de dentro do campo! Por um centimetro essa bola não saiu do campo para um Home Run que possivelmente teria mudado o rumo da série. Mas não, a bola caprichosamente, como se realmente fosse o destino, bateu na parte de cima e não permitiu o Home Run, ficou apenas com uma rebatida dupla que Cain tratou de garantir que nao seria mais que isso.

O jogo final, o jogo cinco, não poderia ser diferente. O duelo sensacional entre Cliff Lee e Tim Lincecum foi absurdo e durante seis entradas não tivemos nenhuma corrida. Os dois foram brilhantes eliminando jogadores, controlando os rebatedores e usando o braço quando necessário. Mas os pitchers cansaram e, na sétima entrada, com Cody Ross e Juan Uribe nas duas ultimas bases, Edgar Renteria, que teve a rebatida que deu ao Florida Marlins o título da World Series de 1997, que antes do jogo disse a Aubrey Huff que ia mandar a bola do outro lado do muro, pegou uma bola baixa de Cliff Lee e mandou a bola longe, do outro lado do campo. A bola caprichosamente bateu no topo do muro. E saiu.

Home Run para Renteria, e 3 a 0 no placar pro Giants. Nelson Cruz até assustou ao acertar um Home Run contra Lincecum, sua unica falha na partida quase perfeita, mas de nada adiantou. Lincecum eliminou quem veio depois, Brian Wilson fechou com maestria sua sexta partida com um save nos playoffs e os Giants se sagraram campeões.

O Giants foi o time que mais mudou na pós temporada. O calouro as vezes pouco confiavel Bumgarner foi perfeito na final, Tim Lincecum derrotou jogadores como Derek Lowe, Roy Halladay e Cliff Lee (Duas vezes), e tanto Matt Cain como Brian Wilson nao cederam uma corrida sequer em varias atuações dominantes. O Giants foi o time que cresceu na hora de decidir, o time que acertou suas rebatidas, cujo ataque cresceu, evoluiu e funcionou como uma equipe. O time deixou de lado sua identidade 'eu' que tanto aparece no baseball pra se unir em um grupo. Aubrey Huff, que em 11 anos nunca tinha tido uma rebatida de sacrifício, fez uma perfeita pra poder impulsionar Ross e Uribe uma base pra Renteria depois fechar o caixão, e saiu vibrando, batendo no ombro de Renteria e cobrando sua promessa de acertar a arquibancada com a bolinha. E se aquele bando de restos de outras equipes se uniu em torno de uma equipe de forma perfeita, individualmente não foram menos brilhantes. Huff acertou o Home Run que colocou o Giants na frente no jogo 4 - e eventualmente lhe deu a vitória - alem de ter sido o jogador com as rebatidas mais importantes, nas horas mais importantes. Cody Ross, sem time em Agosto, entrou nos playoffs pra conseguir quatro Home Runs importantissimos contra o Phillies e levar o time à World Series, nomeado o MVP da NLCS. Buster Posey, aquele calouro um tanto obscuro, foi um monstro acertando rebatidas com dois eliminados ou com alguem em base, alem de ter sido perfeito defensivamente, com quatro eliminações em tentativas de roubo importantissimas. E Edgar Renteria, velho, machucado, que deveria se aposentar e não tinha mais gasolina pra queimar, foi o MVP da World Series, onde acertou dois Home Runs importantissimos e impulsionou seis corridas, sendo uma delas a corrida que eventualmente deu o primeiro título da World Series à cidade de San Francisco. Ele, que ja tinha sido o responsavel pela rebatida que deu o título ao Marlins em 1997, agora se junta a um grupo que conta com Joe DiMaggio, Yogi Berra e Lou Gehrig, tres dos maiores jogadores de todos os tempos, como os unicos jogadores da história a terem rebatidas que deram a vitória ao seu time em duas World Series diferentes.

Se a pós temporada é a hora de cada time elevar seu jogo, buscar dentro de si a força pra ir mais longe do que poderiam até então, de individualmente e coletivamente alcançar um novo nivel e acreditar em cada partida até o final, ninguem fez isso melhor do que o San Francisco Giants. Foi o time que mais acreditou, o time que mais evoluiu, o time que mais lutou e o time que, apesar de ser considerado zebra durante todo o ano, sempre jogou com confiança e disposição, apoiado por uma torcida fanática que transformou o AT&T Park no estádio mais temido da pós temporada de 2010 e contando com o brilhantismo de jogadores como Lincecum e Wilson, alcançou um objetivo que nem o mais fanático torcedor do Giants acreditava quando começou a temporada. A cada rebatida com jogadores em base, a cada Changeup de Lincecum que passava a milimetros do bastão do rebatedor, a cada vez que a barba de Wilson virava para a segunda base e fazia seu tradicional gesto de saves, a cada hora que um novo herói improvavel aparecia pra dar a rebatida quando o time mais precisava - Ross, Posey, Huff, Renteria, Uribe - e a cada hora que um Home Run nao acontecia por um capricho do destino ao trombar com o topo do muro ou, em contrapartida, uma rebatida dupla se tornava num Home Run porque caprichosamente a bola igualmente bateu no topo do muro mas saiu, não dava pra discordar do óbvio. O Giants era o time destinado ao título da World Series em 2010.

E agora, San Francisco, pode festejar. Voces são os campeões do mundo! E merecidamente!

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